Caminhada Bíblica de Palmeira das Missões


Caminhar é uma das mais genuínas características humanas. Desde muito cedo o ser humano, nômade, interpretou o caminho como um modelo de sua própria existência. O ato de caminhar, para além do que lhe é próprio, possui significado simbólico capaz de dar sentido aos desafios humanos.

Diferente dos outros mamíferos, o ser humano caminha em pé: assim, tem suas mãos livres e com elas transforma o mundo; de pé, pode ver mais longe e enxergar, com facilidade, até 380 graus; isso o faz ver outros caminhos, outras possibilidades, seu horizonte se alarga.

Na caminhada conjunta, o ser humano vê-se membro de um corpo, o de sua própria comunidade. Neste corpo sente-se fortalecido, participante, necessário, incluído. Um mesmo caminho, um mesmo ritmo, um mesmo sonho, um mesmo destino: é possível um mundo fraterno entre os filhos do mesmo Pai!

A Bíblia é o livro do caminho. Foi revelada e escrita na caminhada do povo. No Antigo Testamento, Deus ficava sobre o Tabernáculo durante todas as etapas de sua peregrinação” (Êxodo 40, 38). O Tabernáculo era a Tenda que guardava as tábuas da Aliança onde estavam os Dez Mandamentos (Números 9, 15). Assim, Deus guiou seu povo de dia com uma coluna de nuvem e de noite com uma coluna de fogo, a fim de marcar e iluminar o caminho em que deveriam andar (Neemias 9, 12). No Novo Testamento a própria Palavra Divina se faz carne em Jesus e assume o caminho humano. Ele nos fala do Pai e do seu Reino. E o Espírito Santo é derramado sobre a Igreja para que a Palavra de Cristo não se perca e seja registrada pelos escritores sagrados pertencentes às comunidades que continuam o caminho de Jesus (João 14, 26).

Assim, o primeiro nome do Cristianismo foi “O Caminho” (At 9,2; 19,9, 23; 22,4). Faz menção há um jeito de seguir na vida. Esse jeito é o de Jesus, que também declarou sobre si como sendo o Caminho – “Eu sou o Caminho a Verdade e a Vida” (João 14, 6).

O mais antigo Catecismo da Igreja, a Didaqué (ano 145-150 d.C.), inicia dizendo: “Existem dois caminhos: o caminho da vida e o caminho da morte. Há uma grande diferença entre os dois. Este é o caminho da vida: primeiro, ame a Deus que o criou; segundo, ame a seu próximo como a si mesmo. Não faça ao outro aquilo que você não quer que façam a você” (Didaqué 1, 1-2). 

Foi no caminho que Jesus “explicou as Escrituras” aos discípulos de Emaús fazendo lhes arder o coração, compreender as Escrituras e acolher o Ressuscitado. No fim da caminhada celebrou a Eucaristia com o “Partir do Pão”, eles O reconheceram e fizeram o caminho de retorno para dizer a todos “nós vimos o Senhor” (Lucas 21, 13-35). Nesta cena temos o protótipo da nossa Caminhada Bíblica: Jesus caminha com o povo, explica a Sagrada Escritura, faz arder o coração, emociona, envolve, ilumina; no fim, ao celebrar o “Partir do Pão” na Santa Missa, o povo afirma: “Ele está no meio de nós!”.

Há 47 anos jovens de nossa paróquia tiveram a inspiração de fazer uma Caminhada diferente. Saíram da igreja do Rosário e foram à capela Senhor Bom Jesus lendo e refletindo a Bíblia. Tão forte foi a experiência que ela perdurou e cresceu; agora é evento de toda a paróquia e de todo o povo: é Caminhada Bíblica!

Eles não foram os primeiros. Na década de 1850, quando aqui ainda era vilinha da Palmeira, na localidade do Potreiro Bonito, um tigre (assim chamado) entrou no rancho de pau-a-pique dos agregados de Miguel Rodrigues Vieira e atacou o filhinho do casal. Sabendo que o tigre voltaria, Miguel e seu vizinho saíram à procura do felino. Ao encontrá-lo, uma luta foi travada. O tigre feriu os dois homens e seus cachorros, embora tenha sido morto por eles.

Ao ver-se todo machucado, Miguel pensou na imagem do Senhor Bom Jesus coroado de espinhos, ensanguentado e ferido. Rogou a Ele com fé e devoção. Prometeu-lhe que, se curado, iria a pé até Iguape (SP) buscar uma imagem, para a qual ergueria uma capelinha no lugar da batalha com o tigre. Como a cura aconteceu, Miguel fez a caminhada de ida e volta trazendo um quadro do Senhor Bom Jesus. Foi a peregrinação precursora da Caminhada Bíblica.

Hoje fazemos Caminhada Bíblica porque sentimos que é um momento de esperança e gratidão, à semelhança da caminhada que fez o sr. Miguel e de tantas mulheres e homens de fé. O povo de hoje, também ferido tantas vezes, quer por doenças, por decepções, por injustiças ou por tragédias, busca o mesmo Senhor Bom Jesus para que seja Ele o socorro propício e o modelo de resistência e fidelidade à Palavra Divina.

Hoje fazemos Caminhada Bíblica porque nosso coração anseia pela paz que só o Senhor pode nos dar em seu caminho. A Bíblia em nós ecoa orientando nossos passos. Como outrora Deus nos fala, Sua Palavra vai guiando, faz arder o coração desta gente caminhando.

Hoje fazemos Caminhada Bíblica como Moisés e Abraão, como os profetas de Israel. Somos povo peregrino de pés no chão e olhar no céu. Estamos no caminho, o amor nos desafia, com os Apóstolos e Mártires e a Mãe de Deus, Maria.

Nossa caminhada é símbolo da Igreja que nos pede Deus através do Papa Francisco: uma “Igreja em saída”. Sim, saímos de casa, saímos para caminhar, saímos para ouvir a Palavra de Deus. Saímos para não esquecer que fazemos parte de um povo que caminha. Saímos para não esquecer nossa vocação missionária. Saímos para nos aproximarmos, ainda que simbolicamente, de quem nos precedeu no caminho da fé. Saímos porque Deus também um dia saiu, esvaziando-se de si mesmo, para caminhar com a humanidade, tornando-se homem em Jesus de Nazaré (Filipenses 2, 7). E por isso saímos para caminhar com Ele, para Ele, por Ele e Nele. É por isso e por tanto mais que saímos e fazemos Caminhada Bíblica.

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