Homilia do Domingo de Ramos


Quando uma mãe perde um filho, conta e reconta emocionada sua história. Quando uma esposa lembra da morte do seu amado, seus olhos ficam vermelhos de dor. Mas a mãe e a esposa que amam, contam os detalhes da entrega de amor que o amado fez para salvá-las de um mal eminente. Assim é a Igreja hoje. É a esposa que conta a todos, de novo, o que fizeram com o seu Amado. Como os olhos da amada, vermelhos e encharcados, de vermelho também se reveste a Igreja, para contar mais uma vez a todos: mataram Aquele que eu tanto amo.
A narração do evangelho da paixão é a história nos lábios da Igreja, a esposa de Cristo, que lembra como Ele nos amou em cada detalhe, em cada minuto, em cada gesto de sua vida. Mas também, a Igreja se associa à Nossa Senhora que, como mãe, conta a história de seu filho.
Nada de mais triste há do que ouvir a história da morte de alguém amado. A Igreja começa narrando essa história como as mães narram a história de seus filhos: “Ele entrou tão bonito em Jerusalém. Todo mundo o olhava com um olhar especial, pegavam os ramos e diziam ‘Hosana, hosana nas alturas. Bendito aquele que vem’ (Cf. Mt 21, 1-11). Assim era Jesus. Montado naquele jumentinho parecia, de fato, um rei. E o povo via nele a sua esperança. Por isso gritava ‘Hosana’ que significa ‘salva-nos’”.
É assim que a Igreja, apaixonada pelo seu esposo, começa a liturgia da Semana Santa, mostrando o quão bonito, o quão grande, o quão especial Ele é. É assim que as mães contam as histórias de seus filhos, começam pelo que era mais amável no seu amado.
Em cada ramo de árvore que balança ao sopro do vento, a Igreja lembra, nesse dia, o quão especial foi a passagem do seu amado na terra. Para nós, cada ramo de árvore que balança ao sopro do vento é uma aclamação ao rei do universo. Viva Jesus! Mas a esposa de Cristo, a Igreja, desta entrada triunfal de Jesus em Jerusalém, passa aos fatos mais doloridos.
“O nosso Amado, no momento de sua última liberdade, fez uma ceia para nós” - a mãe que se lembra da refeição que o filho fez - a esposa que conta os alimentos que o esposo trouxe para casa. “E, no meio daquela ceia, ele nos deu o seu corpo e o seu sangue; como ouviremos na Quinta-feira Santa, ele lavou os nossos pés” - a esposa lembra dos detalhes do seu amado e a mãe dos detalhes do seu filho. Foi nessa mesma noite que o amado precisou ir para o Monte das Oliveiras e nenhum dos seus amigos foi capaz de rezar com ele. O esposo e o filho suplicavam ao Pai do céu: “afasta de mi, esse cálice”. E sozinho, o esposo, por causa de sua esposa que somos nós, foi até o fim. Recebeu o beijo traidor, recebeu a coroa de espinhos, a flagelação que arrancava pedaços do seu corpo amado pela Igreja e gerado no ventre da mãe. A mãe e a esposa não esquecem desses detalhes. O Amado foi julgado como o pior de todos os homens. O Amado foi cuspido, espancado, zombado, chamado de mentiroso, pisoteado. O Amado foi julgado pelos poderosos deste mundo que não souberam manter o pulso firme da justiça e lavaram suas mãos de forma covarde. Como dói na esposa! Como dói na mãe! A esposa e a mãe somos nós, a Igreja.
“Por fim, colocaram nas costas de nosso Amado uma cruz pesada, o levaram ao monte Calvário e o crucificaram. Lá, no alto da cruz, o nosso Amado, não mais e aguentando a dor, disse: ‘Meu Deus, meu Deus, porque me abandonaste? (Mt 27, 46)” Como você e eu dizemos muitas vezes, como a amada e a mãe dizem muitas vezes: “onde Tu estavas, Pai? Porque nos abandonaste? Mas o Cristo não pára misso. “Em Tuas mãos, Pai, eu entrego o meu espírito (Lc 23, 46).” O Amado, o filho amado é crucificado. Entrega-se nas mãos do Pai. E também a mãe e a amada. A mãe Igreja e a Igreja esposa se entregam como o seu filho e seu amado se entregam nos braços do Pai, nos braços da cruz.
 e em toda a Semana Santa as cruzes que levamos são a cruz do nosso amado. Ele as assume. A cruz da doença, da dor física, espiritual ou emocional; a cruz de uma traição, de não ter o dinheiro e o pão de cada dia; a cruz de se estar longe de quem se ama, a cruz de uma injustiça; a cruz da idade, a cruz de não ser amado, não ser respeitado. Todas as cruzes.  - Qual é a sua cruz? - Todas as nossas cruzes estão nos ombros do Salvador. Todos os nossos sofrimentos, nessa semana, são os sofrimentos Dele. Como diz o Profeta, “eram os nossos sofrimentos que ele carregava” (Is 53,4).
Estamos no mundo inteiro sofrendo com a cruz dessa pandemia da COVID-19 e temos também descoberto cruzes em nós nesse tempo de isolamento que pensávamos já as ter superado. Muitas vezes dá vontade de parar, de desistir, de não seguir em frente, porque nos sentimos os piores dessa terra, nos sentimos os esquecidos, os abandonados, os perdidos. Nesta semana em que recordamos da cruz de Cristo, unimos a nossa a Dele. E, de novo, com Ele, o nosso amado, retomamos nossa cruz e vamos em frente. Ele nos amou e se entregou por nós (Cf. Gal 2,20). Foi com essa certeza que Nossa Senhora se levantou depois da cruz, depois de ter recebido nos braços o filho ensanguentado e falecido. Foi com essa certeza que a Igreja se levantou depois da cruz, porque viu em cada momento da cruz esse amor infinito de Jesus que nos salva, que nos dá coragem, que nos mantem de pé. Por suas feridas fomos todos curados (Cf. 1Pe 2, 24). Meu irmão, minha irmã, põe a tua ferida na ferida de Cristo, põe a tua cruz na cruz de Cristo e verás a força do amor Dele por cada um de nós.
Hoje, Domingo de Ramos, e em toda Semana Santa, a Igreja, banhada de lágrimas, com os olhos vermelhos, conta e reconta, reza, proclama, medita e contempla o seu amado, o seu filho. Do mesmo jeito que uma mãe conta a história da morte do seu filho, que uma esposa conta a história da morte do seu amado, a Igreja conta a história da morte de Jesus: lembra que ele foi muito especial para todos, que houve um momento em que todos o aclamaram e o receberam. Mas também conta, detalhadamente, com suspiros da alma, até que ponto foi a crueldade humana e a força do pecado. Bem mais do que isso: conta até que ponto foi o amor desse filho e foi o amor desse esposo nosso, Jesus Cristo. E é assim que vamos viver essa semana: amando Jesus como uma esposa. Homens e mulheres assumem o amor esponsal da Igreja; crianças, jovens, adultos e idosos - todos - assumimos a posição de uma mãe, contando, meditando, proclamando e contemplando a morte do filho de Deus, a morte do nosso filho e, em Cristo, a morte dos filhos desse mundo.
“Ele entrou lindo e Jerusalém. Os nossos olhos o contemplavam admirados e apaixonados. E nós levamos os ramos nas mãos, entendendo no chão os mantos e o aclamamos. ‘Bem-vindo’, nós dissemos, ‘entra em nossa cidade’. Nós clamamos a Ele: ‘vem e salva-nos’. Mas, de repente, também vimos o nosso Amado expulso de nossa cidade e crucificado numa cruz. O nosso Amado, o nosso filho amou-nos até o fim, e nos trouxe aquilo que ninguém nos poderia trazer, a salvação.
O mundo tem jeito, a minha dor tem jeito, tudo é possível, porque Cristo amou-nos até o fim, até a morte e morte de cruz. Amém.

Pe. Nildo Moura de Melo, OSFS


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