No tecer das lágrimas
Lágrima
sincera é aquela que surprende e se mostra mais forte que a nossa intenção, dribla
o nosso jogo duro. Mesmo não querendo chorar, nossa voz embarga e não podemos
conter. O choro se mostra como a palavra da alma, como o inrromper da verdade,
o suspiro do ‘eu’. As lágrimas nos calam porque o coraçao precisa falar. Sim! Chorar é derramar sobre as feridas do
coração uma porção de vida. Lágrimas são suspiro da alma. Às vezes dói muito e não
sabemos dizer onde. Então as lágrimas nos falam que há uma vida em nós que
precisa de aconchego, que precisa de respostas, que precisa de amor, de um amor
semelhante àquele da pessoa amada que não está mais conosco.
Amigos, me recordo de duas coisas. A primeira
é de que em muitas lendas indíngenas, a lágrima é interpretada como elemento da
origem de coisas preciosas e sagradas, como: diamantes, ouro, pedras, plantas, animais,
espíritos... Fruto de uma dor, da palavra não dita sobre esta dor, do último
suspiro da alma, ela rola sobre a face do homem, toca o chão da terra e se
transforma em algo essencial para a tribo. A lágrima nos mitos indígenas é
fecunda. Lava a face humana e renova a comunidade. Jamais é estéril, assim como
jamais é estéril a verdade, o amor, a compaixão. Quanto sabedoria
que a vida recolheu, não é mesmo!? Isto me faz pensar mais, me leva a entender
que o choro deve ser
como a chuva, depois de regar a terra do coração, deve fazer brotar a semente
da alegria e da fortaleza! Não, ele não tem valor em si mesmo, mas naquilo que
revela. Choro que termina em choro é choradeira. Choro que faz das lágrimas
semente é vida.
A segunda é
uma experiência que eu e você já vivenciamos: aquela espera pelo brilho do sol
depois da tempestade. No sofrimento, as lágrimas revelam a tempestade pela qual
estamos passando. O mesmo é necessário que aconteça conosco: que brilhe o sol
do sorriso após a tempestade revelada nas lágrimas. Nosso sorriso tem poder
restaurador, em nós e nas outras pessoas. É poderoso. Não devemos ignorar.
Sorrir depois das lágrimas é exercício. Um exercício que se torna dom. É
exigente como qualquer outro, mas vital como os raios do sol. É um exercício
tecido, fio por fio, raio por raio. Tal qual as nuvens vão sendo dissipadas
após a tempestade e os fios vão sendo entrelaçados na confecção de uma rede,
assim a expressão feliz precisa ser delineada em nosso rosto. Para que? Para
que novamente nosso caminho seja preenchido de sentido.
Este modo de viver o choro nos ensina a tecer as
lágrimas. Já entendemos que as lágrimas nos surpreendem e que não tem geito a
não ser, deixá-las rolar. Podemos então ficar com elas do jeito que elas vieram;
ou podemos ignorar a mensagem delas; ou podemos tecê-las. Tecer as lágrimas é
tomar tudo o que sentimos, o que entendemos, o que vivemos no momento do choro,
do acontecer do choro e, com a ajuda de quem se dispôs a estar conosco, criar
retalhos na confecção da vida. Cada lágrima é um pedaço de nós que salta em
busca do abraço do outro, em busca do olhar compreensivo, da palavra
acalentadora, de uma razão capaz de nos fazer permanecer de pé, em busca da
resposta de Deus. Por isso precisamos tecer, com elas, uma rede de vida, que
possa acolher a esperança mesmo que não vejamos motivos para esperar.
Se você chora, não ignore o valor de tuas lágrimas. Se você abraça quem
está chorando, não desperdice as lágrimas deste que molha teus ombros. Teça uma
rede de vida, pois cada lágrima é um retalho de amor que banha o solo de tua
existência. Reconheça a fecundidade deste momento que vives. Depois de tudo
isso, esforce-se em arquitetar um bonito sorriso no teu rosto pincelado, no
correr das lágrimas, pela matiz do coração. No tecer das lágrimas uma mulher e
um homem podem se tornar artesãos da vida.
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