OS SACRAMENTOS DA VIDA E A VIDA DOS SACRAMENTOS de Leonardo Boff.


O presente resumo traz o conteúdo da obra de Leonardo BOFF intitulada Os sacramentos da vida e a vida dos sacramentos (Petrópolis, RJ: Vozes, 2004). Quis o autor despertar a dimensão sacramental adormecida ou profanizada na vida das pessoas. Assim ele nos leva, através de historietas, a entender os sacramentos da vida para que possamos entrar na Vida dos Sacramentos. De forma descritiva e poética o livro apresenta definições que ecoam pela vida de todo homem de fé. Mais que uma obra teológica, o livro nos convida a conhecer uma teologia sacramental da vida. É preciso adentrá-lo com atenção e veneração.
Capítulo I. Porta de entrada do edifício sacramental.
O homem está no mundo. Ele “é capaz de ler a mensagem do mundo” (p. 9) através das realidades que, em suma, são sinais de outra realidade. E assim chegamos a Deus, a “realidade fundante de todas as coisas” (p. 10). O homem pode “fazer de um objeto um símbolo e de uma ação um rito” (p. 11). Quando essa ação e esse objeto apontam para outra coisa maior, então chamamos de sacramento. Para o cristianismo a matéria é sacramental. Esta chegou à sua máxima densidade em Jesus Cristo, Sacramento Primordial do Pai. Este deixou a Igreja que é sacramento universal de salvação. Ela se concretiza nas várias situações da vida e funda a estrutura sacramental centrada especialmente nos sete sacramentos (p. 12).
Capítulo II. O Sacramento da Caneca.
A Igreja sempre percebeu que tudo pode ser sinal sacramental da graça divina. Sacramentos são “sinais que contém, exibem, rememoram, visualizam e comunicam uma outra realidade diferente deles, mas presente neles” (p. 18). A linguagem da religião e do sacramento nunca é apenas descritiva, mas principalmente evocativa: de um passado e de um futuro vividos no presente (p. 18). O exemplo da caneca que traz o autor evoca muito bem isso. Quem olha de fora com um olhar científico não enxerga o mesmo que quem olha de dentro com um olhar sacramental. “Sacramento significa exatamente essa realidade do mundo que, sem deixar o mundo, fala de um outro mundo, o mundo humano das vivências profundas, dos valores inquestionáveis e do sentido plenificador da vida” (p. 20).
Capítulo III. O Sacramento do toco de cigarro. Capítulo IV. O Sacramento do pão.
O toco de cigarro lembra ao autor o pai que viveu e vive com ele. Ele remota à fé, que “ilumina e exorciza o absurdo da morte” (p. 22). Quando mais profundamente o homem se relaciona com o mundo e com as coisas do seu mundo, mas encontra a sacramentalidade (p.23). Recordemos a ilustração do pão que a mãe faz para os filhos na história contada pelo autor. Esse pão é “diferente porque recorda e traz presente por si mesmo (in-manência) e através de si mesmo (trans-parência) algo que vai além de si mesmo (trans-cendência)” (p. 29). E essa é a dimensão sacramental daquele gesto que a mãe zelosamente repete. Esse gesto depende também de quem observa. Isso pode ser alargado ao mundo.
Capítulo V. O Sacramento da vela natalina.
Para quem vê tudo a partir de Deus, o mundo todo é um grande sacramento; cada coisa, cada evento histórico surge como sacramento de Deus e de sua divina vontade (p. 34). Eis que portanto, se pode dizer: “o sacramento é uma parte do mundo (in-manente) mas que traz em si um outro Mundo (trans-cendente), Deus” (p. 35). Os sacramentos possuem ambivalência ou dois movimentos: um que vem de Deus para a coisa e outro que vai da coisa para Deus. Tem a função indicadora e a função reveladora (p. 35). Indica e aponta para Deus presente dentro dele, não com o objeto, mas no objeto. Vai do objeto para Deus. Em sua função reveladora o sacramento revela, comunica e expressa Deus presente nele. Não tira o homem de seu mundo, mas dirige um apelo para que olhe mais profundamente para dentro do coração do mundo (p. 36). Assim, pois, “a vocação fundamental do homem terrestre consiste em tornar-se um homem sacramental” (p. 36).
Capítulo VI. O Sacramento da estória da vida.
“Para a Igreja Primitiva sacramento era de modo particular a história humana dentro da qual se realiza o plano salvifico de Deus, a acolhida ou rejeição da graça por parte do homem” (p. 39). E a história humana pode se prestar a ser sacramento de muita coisa. A Bíblia apresenta a história como sacramental. No Antigo Testamento o povo judeu vê o passado como sacramento do presente (p. 40). Sob Davi e Salomão, o Javista “interpreta a paz do presente como encarnação da salvação de Deus para o seu povo” (p. 40). Duzentos anos após, o Eloísta relê “os fatos passados como sacramentos do presente infeliz” (p. 41). O Novo Testamento vê em Jesus Cristo ressuscitado o “fato decisivo da humanidade: aí se mostrou a libertação da morte, das limitações da vida e o absurdo histórico é possível” (p. 41). Todos os outros personagens e acontecimentos históricos são sacramentos de Cristo (p. 42). Da mesma maneira a Igreja viu-se preparada desde Adão e Eva até o grupo dos Doze. Todos eles foram sacramentos para a Igreja. Outra possibilidade de leitura sacramental é ver tudo a partir do fim derradeiro da história, a partir do céu e do inferno (p. 42).
Capítulo VII e VIII.  O Sacramento do professor primário e o Sacramento da casa.
Jesus Cristo é o sacramento do encontro. Nele “Deus está em forma humana e o humano em forma divina” (p. 47). Lembremo-nos agora da metáfora da casa. Ela é um sacramento denso e fontal (p. 49), “é a porção do mundo que se tornou sacramental, doméstica, humana, onde cada coisa tem seu lugar e o seu sentido, onde não há nada de estranho” (p. 48). “Cristo é o sacramento do Pai e a Igreja é o sacramento de Cristo” (p. 50). Ela também é casa. Se torna sacramento enquanto participa e diuturnamente atualiza o sacramento de Cristo (p. 50). “Mais do que organização, a Igreja é um organismo vivo; mais do que instituição de salvação, é comunidade de salvação” (p. 51). Assim, tudo nela é sacramento, porque recorda Cristo e concretiza a Igreja-sacramento. Ela se faz presente lá onde Cristo e sua graça alcançam (p. 52).
Capítulo IX. Os eixos sacramentais da vida.
Até o século XII tudo que revelava a ação de Deus e a comunhão do homem com Ele era considerado sacramento. O concílio de Trento (1547) fixou os sete que hoje temos baseando-se no critério da consciência (p. 55). Estes sete sacramentos “traduzem ao nível ritual os eixos fundamentais da vida humana” (p. 56). Assim eles se desdobram e sublinham os momentos chaves da vida. O Batismo é o nascimento para Deus e coloca a criança naturalmente dependente na dependência de Deus e a sublima como participação na vida de Cristo (p. 56). O sacramento da Confirmação é o da madureza cristã. A Eucaristia desdobra o sentido latente do comer como participação na própria vida divina. O Matrimônio sublinha a gratuidade do amor e a presença de Deus nele. A Unção dos enfermos expressa o poder salvífico de Deus. O sacramento da Penitência articula a experiência do perdão e o encontro entre o filho pródigo e o Pai bondoso. O da Ordem consagra pessoas para o serviço e a reconciliação. São sete e assinalam que a totalidade da pessoa humana em sua dimensão material e espiritual é consagrada pela graça divina (p. 58).
Capítulo X. Em que sentido Jesus Cristo é o autor dos sacramentos?
 “Generalizando, podemos dizer que os sacramentos que hoje possuímos na Igreja já pré-existiam à Igreja” (p. 62). Alguns sacramentos como o matrimônio e o batismo já existiam nas culturas na forma de ritos variados. Eram sacramentos divinos e latentemente cristãos. Destes chamados sacramentos divinos se passa aos sacramentos explicitamente cristãos. Todos os sacramentos vêm do Verbo eterno. O concílio de Trento não quis proferir um juízo histórico quando afirmou ser Cristo o autor dos sacramentos. Antes quis dizer que “é Jesus Cristo que confere eficácia ao rito celebrado. Não quis definir a instituição do rito, mas a força salvífica do rito, que não provém da fé do fiel ou da comunidade, mas de Jesus Cristo presente” (p. 64). Ele é autor enquanto Verbo eterno, depois como Verbo encarnado e porque, biblicamente em ao menos três sacramentos ele estabeleceu uma referencia explícita a si mesmo (p. 63-64).
Capítulo XI. O sacramento da palavra dada.
Assim, ficou claro que “o sacramento na Igreja visibiliza, comunica e realiza o que significa” (p. 67). O termo usado pelo concílio “ex opere operato” quer dizer: “uma vez realizado o rito sacramental, colocados os sagrados símbolos, Jesus Cristo age e se torna presente e isto em virtude da promessa de Deus mesmo” (p. 68). Assim, Deus assume os sacramentos humanos como o pão e a água, para através deles produzir um efeito que supera as forças deles mesmos; não quer outra coisa senão revelar com toda ênfase esta verdade: Deus nos amou primeiro, ainda quando éramos seus inimigos. “Amor gratuito e total em Jesus Cristo, na Igreja e nos sete sacramentos” (p. 70).
Capítulo XII. O sacramento da resposta dada e do encontro celebrado.
Outra bela figura de sacramento é a do encontro, pois “o sacramento emerge, fundamentalmente, como encontro do Deus que dês-cende ao homem e do homem que as-cende para Deus” (p. 72). O concílio de Trento expressou a necessidade da abertura e conversão da pessoa para a eficácia do sacramento. Deus quer, mas é preciso que o homem também queira. E mais, exige compromisso, engajamento. Aliás, na Igreja primitiva só recebia o sacramento do batismo (o rito) quem se comprometia ao engajamento (sacramentum) para o martírio (p. 74).
Capítulo XIII. O dia-bólico e o sim-bólico no universo sacramental.
O sacramento requer fé, pois sem ela não fala nada e de nada (p. 77). Em segundo lugar o sacramento expressa a fé e em terceiro, a alimenta. Por fim, o sacramento concretiza a Igreja universal para uma determinada situação crucial da vida (p. 77-78). Ele é rememorativo, comemorativo e antecipativo. É a vida, pois “são os sacramentos da vida que festejam a vida dos sacramentos” (p. 78). É preciso ter cuidado para não profaná-los. O sacramento pode ser buscado de forma dia-bólica, também. Quando se busca por buscá-lo (sacramentismo), quando se vai com espírito capitalista querendo acumular graças e quando se lhe atribui espírito mágico. É preciso conversão para viver a vida que os sacramentos concedem. Sim, conversão, pois “sacramento com conversão é salvação” (p. 84).
Opinião referente à obra.

O autor atinge seu objetivo quando propõe encontrar no solo da vida e dos acontecimentos mais corriqueiros os sinais transcendentes que se legitimam como sacramentos. Ele foi feliz nos exemplos, nas descrições e na conceituação de cada item necessário para o estudo-aprendizagem do tema Sacramentos. É uma teologia altamente sofisticada, mas apresentada como certo sacramentalismo, por isso, de fácil compreensão. Cabe sua leitura muitas vezes, bem como sua socialização. O resumo nas últimas páginas conclui com maestria a obra. Mais do que falar dos sacramentos, Boff deixou que os sacramentos falassem ao recordar fatos, ritos e objetos do comum de sua vida, remetendo-nos, como leitores, aos fatos sacramentais de nossa história pessoal. Excelente indicação.

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