Religiões do Mundo. Em busca dos pontos comuns, de Hans KÜNG

O livro “Religiões do mundo. Em busca dos pontos comuns” está dividido em sete capítulos, iniciando com a abordagem das religiões tribais e indo até o Islamismo. No primeiro capítulo, religiões tribais, o autor recorda que a humanidade busca um paraíso perdido. Na Austrália, no gigantesco monólito de Uluru, hoje chamado Ayer´s Rock, encontra-se vestígios de vida humana a mais de cem mil anos. Os aborígenes que aí viviam acreditavam na existência do “Grande Pai”, uma referência à divindade.  Os velhos mitos, ritos, símbolos e centros formam os quatro elementos essenciais das religiões tribais, e estes acabam perpassando todas as religiões. O homo sapiens provém da quente e selvagem África tropical e subtropical, muito provavelmente do Great Rift Valley siro-africano ao norte do Zambese, o maior rio africano. Nos albores da pré-história, dois milhões de anos antes de qualquer cultura escrita, surgiu ali o homo habilis, o homem que sabia talhar ferramentas de pedra. Crer em espíritos protetores e espíritos ruins, o sacrifício de cabras e a cura espiritual fazem parte fazem parte das crenças religiosas africanas. O autor destaca que o colonialismo imperialista europeu roubou os africanos da África nos séculos XVI e XVII e roubou a África dos africanos no século XIX e XX. A evangelização cristã muitas vezes legitimou tal violência. Mas também ressalta que o cristianismo encontrou uma forma africana de existir, seja na arte – o próprio Cristo foi africanizado -, seja nas igrejas independentes. A África oferece uma forte contribuição para a construção de uma ética mundial: com seu forte senso de comunidade e solidariedade; com a alta apreciação dos seus valores e critérios tradicionais; com sua visão holística do mundo e do homem, onde há lugar para os jovens e velhos e onde a tradição e o progresso andam de mãos dadas. Esse é um ponto de diálogo para nossos dias.
No segundo capítulo é abordado o Hinduísmo como uma religião alegre e festiva.  Hindu é um termo usado para designar todos os habitantes das margens do rio Indo. Desde o século XIX, Hinduísmo designa unicamente a religião indiana. É um conceito coletivo para um grande número de tradições e correntes religiosas da Índia. O Rio Ganges é o rio mais importante para os Indus. É chamado de Mãe Ganga, o “rio da vida”. A sociedade indiana está hierarquizada em castas que, teoricamente, deveriam ter terminado até 1950: Brâmanes ou sacerdotes; Xátrias, guerreiros nobres ou magistrados; Vaixás: agricultores, comerciantes e artesãos; Sudras: encarregados dos trabalhos mais humildes. Brâmanes, Xátrias, Vaixás: origem ariana; Sudras: descendentes dos drávidas ou aborígines. Os escritos sagrados dos hindus são os chamados Vedas, palavra que significa conhecimento, saber. O hinduísmo tem como crença a teoria das reencarnações sucessivas. A lei do Karma: o bem e o mal que a pessoa faz determinará como ele virá na próxima reencarnação. O Samsara é visto de forma negativa, como uma condição a ser superada. O hinduísmo não possui uma doutrina clara e não ambígua sobre a salvação que explique de que modo o homem pode escapar do interminável e cansativo ciclo das reencarnações. Apesar disso, é possível distinguir três caminhos diferentes para a graça, que exerceram papel relevante na história da Índia – e continuam prevalecendo no hinduísmo moderno. São as vias do sacrifício, do conhecimento e da devoção.  É notavelmente ético, embora não apresente uma doutrina racionalmente estruturada; O homem é induzido a praticar uma elevada espiritualidade; a reação contra o ritualismo do “vedismo”, levou ao desenvolvimento do principio de que a intenção desinteressada importa mais do que a ação propriamente dita; elevada moral: com a prática da castidade, da veracidade, da compaixão, da piedade e da não-violência; respeito aos animais: a vaca, o macaco, e a serpente. Talvez aí esteja uma grande contribuição ao ethos universal.
O terceiro capítulo fala das Religiões Chinesas. Estas tem a veneração aos ancestrais como seu centro. Daí que ao enterro dos mortos se dá muito valor e se sacraliza cada ato, inclusive dando-se grandes ofertas, a fim de que os espíritos deles não atraiam infelicidade aos vivos. Três religiões tem destaque e se misturam: Confucionismo, Taoísmo e o Budismo. O confucionismo era a religião do estado, pois Confúcio foi um mestre por excelência, ocupou uma posição comparada a de ministro e pregou verdades éticas desenvolvendo com isso uma corrente filosófica angariando diversos discípulos e propagadores de suas verdades. A outra religião é o Taoísmo, essa surgiu como uma espécie de confronto ao confucionismo, eles não concordavam com a ética que o confucionismo pregava dando valor ao legalismo e as suas posições pró-governo. A partir desse primeiro período, o Tao que entre seus inúmeros significados tem a ver com “uma lei, um caminho” ocuparia destaque na religião chinesa. Seu precursor teria tido as revelações no ano de 142 d.C, Zhang Daoling teve revelações de que os homens estavam fazendo a vontade de demônios, ao invés de servirem ao Mestre do Céu. Hoje o Taoísmo é o que tem maior número de seguidores. O Budismo, que veio de fora para dentro e assimilou práticas chinesas como a meditação e o budismo da fé. O Confucionismo e o Taoísmo quase não abordavam a questão da dor, tão importante à vida humana. O Budismo soube trabalhar este aspecto. O Cristianismo tentou penetrar na China, mas sem o mesmo sucesso. A prioridade da ética sobre a economia pode ser a grande contribuição destas religiões ao mundo.
No quarto capítulo encontramos o Budismo, religião surgida na Índia antes da Era Cristã tem sua origem na pessoa do jovem príncipe Siddhartha Gautama. O príncipe quando deixou todo o luxo do palácio se defrontou com a dor, o sofrimento das pessoas, a morte, a doença e outras moléstias que ainda não conhecia. Então com 29 anos decidiu abandonar sua esposa e seu filho para buscar as respostas que precisava para libertar as pessoas da dor. Através da meditação ele alcançou aquilo que tanto procurava: a iluminação. Daí deriva o nome Buddha, o “iluminado”. Buda morreu aos oitenta anos de idade por ingerir comida envenenada. O budismo passou por várias transformações. No Japão, por exemplo, formou outras ramificações agregando valores do xintoísmo, ali também elegeu outros Budas. Mas seu cerne não foi alterado, as quatro verdades básicas que todo budista deve observar: não matar, não mentir, não furtar e abster-se da devassidão sexual. Küng defende que o Budismo é uma religião e assim contribui para uma ética mundial e para a paz, tendo como grande destaque na atualidade, o monge Dalai Lama.
No quinto capítulo se fala do Judaísmo. Esta é a primeira das três religiões chamadas “religiões do livro”, proféticas e monoteístas. E é, também, a religião que até hoje sofreu maior perseguição. Nos vários períodos de sua história se vê exílios, guerras, domínios de outros povos e, por fim, o genocídio de milhões de judeus na segunda Guerra Mundial.  A história do povo hebreu (do judaísmo) começa com Abraão quando este sai da terra de Ur em obediência a Deus e vai para uma terra a qual não conhecia. É um povo itinerante. Com Abraão, Isaac e Jacó, os três patriarcas, a história acontece até chegar ao Egito na pessoa de José, filho de Jacó. E é no Egito que um quarto nome ganhará o titulo de maior profeta de Israel, na pessoa de Moisés. O profeta confronta o Faraó através das dez pragas, com ele o êxodo acontece, assim como os dez mandamentos é trazido ao povo hebreu no Monte Sinai. Israel viveu três períodos distintos em sua história, de uma comunidade tribal passa a ser um estado, e de um estado, uma monarquia, o que veio a culminar posteriormente em uma teocracia, isso veio acontecer a partir do exílio babilônico, onde os judeus se distinguiram das demais religiões, observando vários rituais de purificação, ali a fé israelita foi provada, no meio da idolatria dos babilônios os verdadeiros judeus são preservados.
Israel sempre esteve sob domínio de outras nações. Quando sob domínio do Império Romano, viu ascender a expectativa messiânica e, é nesse contexto que Jesus de Nazaré aparece pregando as boas-novas de salvação e se declarando o Messias. As autoridades religiosas e o povo em geral, não aderiram. Surgiram muitos círculos revolucionários em busca da independência. No ano 70 da era Cristã houve uma grande derrota e a destruição do Templo. A segunda derrota culminou com a diáspora, no ano de 135. Isso não impediu que sua fé continuasse viva e se propagasse, pois os judeus ao conseguirem influências nas sociedades onde se inseriram também divulgavam sua religião. Hitler foi o grande carrasco dos judeus e responsável primeiro pelo holocausto na Segunda Guerra Mundial.  Hoje se tem novo Estado de Israel na Palestina, mas os judeus estão presentes no mundo inteiro. A terra de Israel sempre é um referencial, mas não um limite para os judeus. Seus dez mandamentos continuam a ser um referencial para uma ética universal.
No penúltimo capítulo o livro traz a religião cristã. O cristianismo surge no seio do Judaísmo. Jesus de Nazaré se torna um pregador messiânico famoso em Israel. Afirma ser o Filho de Deus que os judeus tanto esperavam para libertar Israel. Mas desde o início se mostra um pouco diferente do que a maioria esperava. Na base de sua pregação estava o amor ao próximo. As primeiras comunidades cristãs viviam a alegre mensagem de uma nova liberdade: não se deixar dominar pelo desejo do dinheiro e do prestígio, pela ânsia do poder, pelo instinto do sexo ou pela busca de prazer e gozo, mas tornar-se livre para Deus e para os semelhantes. Solidariedade. Um amor que também respeita o adversário e não liquida o inimigo. Uma mensagem de não violência, de misericórdia e de paz. No constituir de sua história o cristianismo vai perdendo suas raízes históricas e se helenizando. Já no quarto século se torna religião oficial do império e passa a assumir características deste. A hierarquia se faz forte e surgem grandes divisões. A Igreja está sujeita ao Estado e o primado de Roma vai se mostrando forte. Os patriarcados disputam poder, o papado se afirma à sombra do ideal romano. Isto leva ao cisma do Oriente com o Ocidente em 1054. Assim, o cristianismo terá características distintas em cada lado do globo. Depois no século XVI, com uma Igreja preocupada em arrecadar dinheiro e oferecer indulgências, surge o reformador Martinho Lutero na Alemanha que rechaça a prática da Igreja romana e propõe uma vida cristã centrada na Bíblia e na crença da salvação pela graça e pela fé e não pelas obras. No mesmo período surge o Calvinismo e o Anglicanismo. Com o advento da modernidade o cristianismo se vê desafiado. Cresce o ateísmo e a crença na felicidade humana por meio dos meios técnicos e científicos. Também a modernidade enfrenta crises. Aí está a possibilidade do diálogo, único meio pelo qual poderá o cristianismo manter-se firme e continuar a crescer. Desta religião se tem a grande contribuição no caminho do amor e da paz, conforme a vida de Jesus de Nazaré. Nos seus vários segmentos o cristianismo possui uma unidade com o Islamismo e o Judaísmo como a origem nos Patriarcas, o cunho profético e da fé no único Deus, pontos para uma maior unidade e enfrentamento dos problemas da humanidade atual.
Por fim, Hans Küng aborda o Islamismo. Esta religião surgiu após o Cristianismo, e seus adeptos a consideram a verdadeira religião pelo fato de considerarem que o Judaísmo e o Cristianismo se corromperam. É a segunda religião com maior número de seguidores em todo o mundo, (a primeira é o Cristianismo). Seus seguidores não estão somente em países como a Arábia Saudita, ou Iraque, mas também em países europeus como a Espanha e França. Acontece que a política dos califas (dirigentes que surgiram depois de Maomé) e do Império Omíada era também de domínio territorial. Isso possibilitou o Islã alastrar-se sobre os lugares pelos quais os árabes dominaram. Esta religião se fundamenta na concepção de que “Alá é o único Deus e Maomé o seu profeta, aquele que veio selar a profecia”. Nascido por volta de 570 na cidade de Meca e encarregado das viagens de negócios, as quais lhe proporcionaram um encontro com as duas mais influentes religiões desse período, Maomé vai optando por uma vida mais religiosa que comerciária. Com quarenta anos de idade recebeu do alto as profecias. De início disse apenas aos familiares, mas três anos depois começa a pregar em toda a Arábia, pagã e politeísta. Claro que sua pregação iria incomodar os ouvintes que tinham com a idolatria um próspero comércio. Então ele rompe com os laços familiares baseados em clãs e estabelece uma nova comunidade baseada agora em uma única religião, ou seja, a comunidade muçulmana. Essa comunidade se formou a partir da hégira, no ano de 622 na cidade de Medina, a “cidade” do profeta. Na cidade de Medina, Maomé assume a posição não somente de profeta, mas também de um chefe militar, pronto a exterminar aqueles que rejeitarem a sua mensagem e a conversão ao único Deus. Maomé morreu aos 62 anos. Antes de sua morte faz uma peregrinação a Meca, como sinal daquilo que se tornaria um dever a todo muçulmano. Esta se tornou uma prática essencial na vida de um muçulmano que, pelo menos uma vez deve ir à esta cidade, pessoalmente ou através de um representante. Por ser uma religião do coração, o Islamismo tem muito a contribuir no modo de priorizar as escolhas e atitudes na atualidade.

À guisa de conclusão, Hans Küng resume em quatro breves sentenças, o modo pelo qual as religiões podem oferecer sua contribuição ao mundo na busca da realização plena de todos os homens. E assim se expressa: não é possível nenhuma paz entre as nações sem paz entre as religiões; nenhuma paz entre as religiões sem diálogo entre as religiões; nenhum diálogo entre as religiões sem padrões éticos globais; e nenhuma sobrevida do nosso Globo na paz e justiça sem um novo paradigma de relações internacionais na base de padrões éticos globais. Esse é o desafio lançado, não a Deus, mas às mulheres e homens de boa vontade.

(Recensão).


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