Teologia Mística sobre os Coroinhas e Acólitos


A liturgia da Igreja é feita de ritos, palavras, gestos e sinais que apontam para Deus. Esse é o esforço dos batizados que a realizam. No entanto, mais do que uma ação ritual humana, a liturgia é Ação do próprio Senhor[1]. Ele é o protagonista de tudo o que a Igreja celebra. Sem a graça e a presença do Senhor, a liturgia esgotar-se-ia em si mesmo e não seria plena comunhão com a Trindade nem com a Igreja. Mas, como é Ação Salvadora do Senhor, ela remete para bem mais e nos alcança os Mistérios Divinos que fecundam e dão pleno sentido à vida humana.
Assim sendo, também os batizados que exercem funções na Sagrada Liturgia são sinais da Salvação Divina dispensada para com toda humanidade. Desde aquele que preside a Ação Litúrgica até os membros da assembleia, cada qual segundo seu caráter e função específica, participa da comunicação da intimidade de Deus para com a Igreja e da intimidade da Igreja para com Deus.
Nesta troca de dons entre o Céu e a terra, desempenham especial serviço os Coroinhas e Acólitos. Auxiliares dos Ministros Ordenados, eles se assemelham aos anjos no céu diante do Senhor. A liturgia é consentaneamente recordação da história da salvação, anúncio das realidades futuras e antecipação de tudo o que há de vir. Nela, os Coroinhas e Acólitos fazem parte dos que apontam para verdades que um dia contemplaremos plenamente[2]. Assim, durante a liturgia, eles fazem na terra o que os anjos fazem no céu: servem ao Senhor. Seu serviço é caracterizado pela proximidade ao Sacerdote e ao Altar, ou seja, ao Corpo e Sangue de Cristo presente na Eucaristia e na Igreja. O sacerdote age “in persona Christi” (na pessoa de Cristo) e o altar é o próprio Cristo; a Igreja é Corpo de Cristo que o Senhor alimenta com seu próprio Corpo.

Ser Coroinha e Acólito
Ser Coroinha e Acólito é uma missão. Consiste no servir a Cristo na liturgia da Igreja. Todos os batizados têm seu lugar específico no povo de Deus, que chama para os mais variados serviços. Também as crianças, segundo suas condições e possibilidades, podem desempenhar funções de sublime valor. Ser Coroinha e Acólito é uma delas.
O Coroinha e o Acólito, então, é uma criança ou adolescente de grande piedade, comprometido em ajudar sua comunidade a amar a Cristo como a esposa ama seu esposo. A Esposa é a Igreja, o Esposo é Cristo. A liturgia é a celebração mútua de amor entre ambos. E os Coroinhas e Acólitos são aqueles que possibilitam e ajudam a Igreja e Cristo trocarem os seus dons, com afeto, dignidade e beleza. Os Coroinhas e o Acólitos amam a Cristo na Eucaristia, tem certeza de que Cristo está na Santa Hóstia e no Cálice Sagrado, e por Ele fazem tudo. Há duas histórias que ilustram bem a força e a seriedade desse amor.
São Tarcísio. Tarcísio foi um Acólito da comunidade cristã de Roma do século III. O imperador da época, Valeriano, prendia muitos cristãos e os matava. O Papa Sisto II não sabia como levar a Eucaristia para seus filhos cristãos que iriam ser executados no outro dia. Tarcísio, com cerca de 12 anos de idade, ofereceu-se dizendo estar pronto para isso, prometendo jamais entregar as Sagradas Hóstias aos pagãos. O Papa entregou-lhe numa caixinha de prata as Hóstias que deviam servir como conforto aos próximos mártires. Quando passava pela via Ápia, descobriram seu segredo, bateram nele e o apedrejaram até a morte, mas ele não soltou a caixinha com a Eucaristia. Seu corpo foi recolhido por um soldado cristão e, somente diante do Papa, o corpo, já morto, desgarrou-se da caixinha. Deu sua vida por Jesus na Eucaristia. Tornou-se o Mártir São Tarcísio.
Beato Adílio. Adílio Daronch foi o Coroinha do padre Manoel Gonzalez. Morava em Nonoai, RS. Em março de 1924 estavam visitando as comunidades a cavalo, iniciando por Palmeira das Missões (RS) e indo até a Argentina. Quando chegaram na localidade de Feijão Miúdo, no atual município de Três Passos (RS), o padre Manuel e o Coroinha Adílio foram esperados por bandidos armados de tocaia, escondidos na mata. Esses bandidos não queriam saber de um padre ensinando a religião. E assassinaram os dois, amarrando-os numa árvore e atirando neles. Encontrados após cinco dias, não havia sinal de qualquer decomposição e nem os animais mexeram nos corpos. O Coroinha Adílio deu sua vida ao lado do Padre Manoel, por amor a Cristo. Tornou-se Mártir da Igreja e foi beatificado com o Padre Manoel.

A bênção de ser Coroinha e Acólito
Podemos elencar alguns benefícios decorrentes imediatamente do ministério dos Coroinhas e Acólitos para eles mesmos: 1) Os Coroinhas e Acólitos fazem a experiência de amarem e servirem o seu Senhor, 2) são os primeiros a serem beneficiados com tudo o que o Senhor nos dá, pois permanecem pertinho Dele, 3) aprendem a disciplina e a organização para bem servir a comunidade, 4) estabelecem contato e relação com autoridades (o sacerdote é sempre um autoridade), 5) exercitam-se na pertença à sua comunidade 6) e assumem postura frente às pessoas em cerimônias públicas, além de seguirem um programa de formação e espiritualidade. Assim, eles têm organizadamente uma formação humana, religiosa e social que os capacita para protagonizaram sua história com mais autonomia e segurança. Com toda essa riqueza espiritual, os Coroinhas e Acólitos ficam aptos para desenvolverem-se em qualquer lugar que a vida os conduzir.
A comunidade também recebe benefícios com eles, pois: 1) tem as crianças como intercessoras próximos a Cristo Eucarístico (a prece delas possui uma força especial), 2) a singela e cândida presença deles ajuda-nos a concentrar-nos nos Mistérios celebrados, 3) eles têm uma função específica na Santa Missa de modo a possuírem um atrativo para ali estar e se concentrar durante a liturgia, 3) são crianças preparadas para assumirem outros papeis na comunidade quando for oportuno, 4) é um celeiro de vocações ao Sacerdócio e à Vida Religiosa, 5) onde as crianças têm acesso a mais uma fonte de formação.
Dito tudo isto, não resta dúvida de que os Coroinhas e Acólitos são uma bênção nas comunidades e que as comunidades que os acolhem tornam-se bênção para eles. Eles são como os anjos de Deus na sagrada liturgia. Nossa Igreja é bem mais bonita por ter cada um deles.

OS COROINHA E ACÓLITOS NOS RITOS DA SANTA MISSA

Procissão de entrada
A procissão inicial é sinal do caminho que os cristãos fazem para o Céu e da liturgia divina como descrita nas visões joaninas do livro do Apocalipse. Não é uma procissão para entrar na igreja e subir ao presbitério, mas uma memória de que estamos a caminho da vida eterna. A cruz, as velas, o incenso, o Livro dos Evangelhos ou Lecionário, os ministros leigos e ordenados, cada qual em sua Ordem, se dispõe para que seja didaticamente reconhecido que somos Igreja Peregrina que caminha para ser Igreja Triunfante, peregrinos neste mundo a caminho da casa de Pai. Do mundo (fora da assembleia, no átrio ou na sacristia), passando pela Igreja (assembleia, nave da igreja), vamos ao Céu (presbitério). No final da procissão está o presidente da celebração representando o próprio Cristo, nosso Salvador. O que um dia Cristo conquistou para nós, Ele atualiza à comunidade, aqui e agora, na pessoa do sacerdote.
Na procissão de entrada os Coroinhas e Acólitos perfilam-se como o cortejo dos anjos, trazendo tudo o que é necessário para servir ao Cordeiro (Cristo Jesus), à imagem do que nos descreve o livro sagrado do Apocalipse (Ap 5,6). O canto inicial completa o perfeito quadro desta imagem divina que a Procissão inicial deseja retratar.

A Cruz
O primeiro símbolo que trazem é a Cruz. O turíbulo e a naveta que a precedam nas celebrações solenes conduzem à olhar a contemplar Cruz como o princípio de tudo. O Coroinha ou o Acólito traz a cruz, sinal de que se vai celebrar o sacrifício de Cristo, sinal de que a nossa salvação veio dali, sinal do corpo do Senhor imolado no madeiro. Nunca podemos nos esquecer que toda a graça que hoje temos custou muito e que o nosso caminho é o da cruz, o do amor sem medida, oblativo, concreto e infinito.
O Coroinha ou o Acólito empunha a Cruz como quem empunha a bandeira de nossa salvação. É mais do que um símbolo, é a verdade que salva o mundo. Com orgulho, profundo respeito e amor valente, ele a introduz na santa Missa para dizer ao povo: vai começar tudo de novo. Aquilo que aconteceu lá na cruz vai acontecer aqui de novo. Esse santo lugar onde estamos torna-se o Calvário e o Cristo nos dará sua vida, nesta hora acontecerá a morte e ressurreição do Filho de Deus, tudo de novo, tudo verdade, aquilo que aconteceu na história agora acontece no sacramento que vamos celebrar. A cruz “primeireia” a procissão porque tudo vem dela. Nela, Deus refez a criação, refez o ser humano, recomeçou a obra de suas próprias mãos.

As velas
E para que se torne mais claro ainda que a Cruz é a vida do mundo (não ela em si, mas Jesus que nela deu a vida), ela vem ladeada pelas velas (duas, quatro ou seis e, na presença do bispo, sete). É viva, é vida, é vivificante. É sinal do Cristo vivo amando e salvando eternamente a humanidade e dando-se em corpo e alma à Igreja, sua esposa.

O incenso
O incenso (também o turíbulo e a naveta) marcam a reverência para com os Mistérios Sagrados e o desejo de que tudo seja oração subindo aos céus[3]. O olfato, por ele aguçado, nos convida a dar-nos conta de que estamos um espaço e num tempo diferente, do culto e da adoração a Deus. Os Coroinhas e Acólitos agem como aqueles que vem do céu para conduzir ao céu, melhores amigos de Jesus que levam a comunidade a entenderem a sacralidade de tudo o que está sendo celebrado.

A Palavra de Deus
A Palavra de Deus é o livro da vida e os Evangelhos a presença do Verbo Divino, Cristo. Entra inicialmente para alimentar o povo, ser a presença de Jesus Cristo Palavra Eterna, instruir-nos no caminho que Ele percorreu e nos deixou. Assim que principia a celebração, a assembleia já toma ciência de qual será a palavra que ouviremos: a de Deus. Por isso, ela vem elevada para que todos já a adorem e se abram ao que o Senhor deseja comunicar-nos.
Toda a liturgia católica é Palavra de Deus. As munições e orações são constituídas de textos das Escrituras. E, na maioria, o são literalmente. Como pela Palavra tudo foi feito (Gn 1), também na liturgia o será. É esta Palavra que se fez carne, é esta Palavra que nos salva de corpo de alma e tudo recria novamente.
Quando o Evangelho, Palavra por excelência, for proclamado, estará também ladeado pelas velas: é palavra viva, é Aquele que está vivo: é Jesus. Os coroinhas, apostos com as velas, serão os anjos a nos lembrar disso.

O Missal
O Librífero, responsável pelos livros rituais e de orações e, na missa, pelo missal, é como o anjo que serve ao Senhor para que o Senhor tudo faça pela Palavra, como foi na Criação, no envio de seu Verbo, na vinda do Espírito Santo sobre os Apóstolos.

Os Paramentos
A túnica significa estar revestido de Cristo. Várias são as formas e cores, tendo todas este mesmo significado. A sobrepeliz, quando usada, significa a pureza e a disposição em servir. Seu significado fica muito próximo do avental ou da toalha cingida na cintura por quem realiza um serviço. Sendo a Eucaristia também refeição, quem ajuda pôr a mesa, está digno de o fazer.

A Harmonia
A harmonia entre forma e ritmo que gera a beleza da liturgia é louvor à Criação de Deus e à Redenção que seu Filho nos concedeu. Deus criou todas as coisas numa harmonia e ordem maravilhosas: recordamos isso. O pecado a destruiu, mas a Redenção a refez: celebramos. No entanto, esperamos o dia em que isso se manifestará de forma plena, na escatologia de Deus: antecipamos. A beleza da liturgia é uma forma de adoração à Trindade Santa. Embora ação humana, é o próprio Espírito que reza em nós e nos leva ao Pai, por meio do Filho, Cristo nosso Senhor.
A Preparação do altar
No momento da preparação do Altar, quando se vai apresentar a Deus as oferendas, os Coroinhas e Acólitos se põe a serviço, levando ao diácono ou sacerdote o que é necessário. Deus realiza novamente o sacrifício salvador de seu amado Filho. O que aconteceu no Calvário e na última Ceia do Senhor, acontece sobre o altar. Tudo de novo. Não uma repetição histórica, mas a mesma Eucaristia. Sim, a mesma Eucaristia que Cristo celebrou com o pão e o vinho no Cenáculo e com seu corpo e sangue na cruz, nos alcança. E nós, Igreja, somos levados a ela, como esposa a seu Amado, no espaço e no tempo de Deus. Realmente é aquela Eucaristia celebrada no Cenáculo e na Cruz, algo que só a fé consegue perceber.
E para isso, cooperam os Coroinhas e Acólitos. Em nome do povo de Deus e de toda comunidade, trazem o pão e o vinho. As crianças trazem ao Senhor, que nos salva na Eucaristia, o que Ele precisa para realizar, eterna e ininterruptamente, o que realizou numa única e definitiva vez. Nas mãos dessas crianças, no pão e no vinho, vão nossa vida, nosso louvor, sofrimento, oração e trabalho (Catecismo da Igreja Católica, 1.368). Ali está tudo o que somos e temos.
Para melhor expressar isso, uma gota de água é derramada no cálice. Significa a Igreja que se une ao Senhor, a Igreja que se dá também em sacrifício com Cristo, mistura-se com Ele, pede “a Deus por intermédio de Cristo, para participar da sua vida no sacrifício eucarístico” (São João Paulo II)[4]. É também o Coroinha ou Acólito que apresenta essa água. A Igreja inteira se faz humilde e pequena nas mãos de uma criança, para ser toda do seu Amado.
O sacerdote, depois de apresentar as oferendas a Deus, lava suas mãos num gesto purificatório. Ele, que perdoa pecados em nome de Cristo, diante dos Coroinhas e Acólitos, confessa: sou pecador. Por isso reza: “Lavai-me, Senhor de minhas faltas e purificai-me do meu pecado”. Esse sacerdote, que está presidindo em nome de Cristo, diante deles, inclina-se e lava-se para ser digno de realizar o que Cristo realizou. A misericórdia de Deus assume o rosto tenro dos pequeninos.
Na Consagração Eucarística, de joelhos no chão, eles incensam o Corpo e o Sangue do Senhor. E, de modo especial, tocam a sineta. É como se clamassem a cada coração: “Veja, é o Senhor. Ele está aqui. Adore-o! Ame-o! Seja todo Dele, para Ele, esteja Nele! Está acontecendo tudo de novo. O Senhor nos dá a sua vida, nos ama e nos salva, aqui e agora. Gratidão, adoração!” As sinetas são como as trombetas do Apocalipse: proclamam e anunciam a presença do Cordeiro, que é Cristo Jesus, e convocam todos para adorá-lo.
De joelhos, próximos do altar, do sacerdote, do Pão e do Vinho Consagrados, essas crianças e adolescentes adoram Jesus, amam-no. São os primeiros depois dos Sacerdotes. E com seu olhar ingênuo e simples, são como Maria Santíssima e o Discípulo Amado. Sim, todos eles são o Discípulo Amado, que nada tem a oferecer ao seu Senhor, senão o seu amor.

A Comunhão
Quando o padre desce para distribuir a Santíssima Eucaristia, os Coroinhas e Acólitos, como guardiões do Senhor, o acompanham. Estão ali para que todos, ao aproximarem, tenham claro: 1) Quem se dá nesta hóstia é o próprio Senhor. Se não o enxerga no pão, nessas crianças você tem o sinal de que algo muito maior ali está. É o próprio Jesus Cristo!; 2) São guardiões do Senhor pronto a defendê-lo de todo mal. Talvez o mal maior, neste momento, seja o da indiferença. Essas crianças O defendem da indiferença. Mesmo que alguém não creia, elas estão ali para crerem, O servirem e O defenderem de quem queira ignorá-Lo; 3) São adoradores que nos ensinam adorar o Senhor, incutem, incitam e "primeireiam" a adoração do Corpo de Cristo. Uma adoração simples e profunda: aquela de só permanecer ao lado Dele quando Ele se dá ao seu povo; 4) Ao dedicarem parte de sua infância ao Senhor e sua comunidade, nos ensinam a grande lição da Eucaristia, a partilha. Não tendo muito a dar, estas crianças repartem seu tempo de brincar e de se desenvolver com sua comunidade e seu Senhor. “Eucaristisam” sua vida servindo, partilhando e amando quem ali está: o Senhor e a Igreja.
Que amor tem eles por Jesus e Jesus por eles! O Senhor nunca os esquecerá. Por toda a vida eles colherão as graças de um dia terem sido Guardiões do Corpo de Cristo.

Pe. Nildo Moura de Melo, OSFS

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[1] “Aquilo que era visível em nosso Salvador passou para seus mistérios” (São Leão Magno – cf. CIgC 1115).
[2] “Deus enviou ao seu servo João o Anjo, que lhe mostrou essas coisas através de sinais” (Ap 1, 1c).
[3] “Cada um tinha uma harpa e taças de ouro cheias de incenso, que são as orações dos santos” (Ap 5, 8 e 8, 3).
[4] São João Paulo II, homilia na Catedral de São Sebastião, Rio de Janeiro (RJ), em 4/10/1997.

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