Teologia da Libertação
O que faz com que uma reflexão cresça, conquiste
respeito e se torne símbolo de um movimento capaz de reunir pessoas de várias
nacionalidades e práticas? Será a sua aceitação ou contestação no meio em que
nasceu e ao público a que se dirige? Será a proposta que apresenta ou nega? Ou
ainda: será pelo fato de se fazer símbolo do grito que surge na última hora em
favor de quem jamais fora ouvido?
Marcada por uma história muito dinâmica de aceitação e
repulsa, reprimendas e incentivos, a Teologia da Libertação ganhou forças à
medida que apresentou um a reflexão teológica pé-no-chão e que correspondia aos
anseios da América Latina. Nascida em uma realidade sofrida, marcada pela
opressão do sistema capitalista, dos países ricos, das ditaduras militares e
pela insensibilidade cultural nas várias dimensões da sociedade, com destaque
para a ação litúrgica e dogmática da Igreja, esta teologia mostra-se forte por
corresponder aos anseios das massas sofrida.
Teologia da Libertação parece ser uma expressão que
pode englobar uma proposta nova no campo teológico e social. Tornou-se a
síntese do ideal de fazer e refletir teológico da América Latina, expandindo-se
para todo o mundo como um fenômeno histórico. O ressoar desta expressão ainda
causa desprezo e temor em alguns ambientes, em outros continua sendo sinal de
esperança e considerado o melhor veículo para atualizar a reflexão da mensagem
divina para as realidades vigentes.
No presente texto, abordaremos a história, o
método, as novidades, as respostas, a opção a atualidade e as novas questões da
Teologia da Libertação. Não pretendemos dizer tudo. Isto seria impossível.
Buscamos apenas refletir o que consideramos como essencial para uma comunhão
com este jeito de ser e fazer teologia.
SURGIMENTO DA TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO
O surgimento é algo que impressiona o ser humano. Junto com o
desaparecimento, é o polo onde a atenção se volta quando alguém quer
compreender mais profundamente qualquer coisa. Eis a razão de ressaltarmos o
nascer e o pôr do sol, o nascer e o morrer de um ser humano, a nascente e o
desaguar de um rio, a primeira e última nota de uma música. Parecemos crer que
o surgimento de alguma coisa é como aquela semente que possui as informações e
nutrientes necessários para o desenvolvimento de uma árvore. Perguntar-se pelo
princípio de algo é ir em busca de sua essência, de sua identidade rústica,
real, franca.
A Teologia da
Libertação possui um berço cercado pela opressão e o sofrimento de muitas
pessoas[1].
É a Teologia Cristã que ao se encontrar neste berço começa a sentir sufocada
pelas contradições e dá um grito em busca da libertação, pretendendo encontrar
na reflexão da fé, uma saída pra as questões sociais e eclesiais que
justificavam a opressão dos pobres e oprimidos do Terceiro Mundo.[2]
É assim que
a teologia da libertação nasce no final
dos anos 60[3],
como expressão viva
de uma experiência de fé libertadora. Ela não traduz uma reflexão deslocada,
mas surge sempre num segundo momento, enquanto expressão articulada de um
processo histórico marcado pela pobreza,
esperança e busca libertadora. Não há como compreender a TdL fora do “humus
eclesial e social” que marcou o continente latino-americano a partir do final dos anos 50. Ela não é só
reflexo de uma fé libertadora, mas exercício sistematizado de reflexão e
aprofundamento desta fé. (TEIXEIRA, 2006, p. 28).
A América Latina possui uma
história de sofrimento e opressão desde a colonização europeia. As etnias que
compõem esta parte do globo terrestre foram sempre divididas entre dominados e
dominantes. Os dominantes, claro, sempre foram uma minoria que impuseram
escravidão, exploração e alienação aos menos favorecidos. Indígenas, negros,
mulheres e operários foram vistos como instrumento de produção e manipulação,
sem direitos e com o dever de sustentar os poderes vigentes. Toda esta
realidade foi marcada, a partir de 1500, pela religiosidade cristã. O evangelho
era pregado todas as semanas e o pão amargo da opressão tendo que ser engolido
por grande parte da população.
Diante de tudo isto, ansiava-se
uma libertação. A América Latina queria viver.[4]
Para isto precisava romper com as cadeias que a aprisionavam.[5]
Mas por onde começar? Quem poderia quebrar o primeiro grilhão? Qual grade
deveria ser a primeira a ser derrubada provocando um raio de luz que iluminasse
o interior desta realidade de prisão e suscitasse naqueles que se encontravam
presos, uma vontade resoluta de entrar na marcha de libertação? Pode-se dizer
que havia este murmúrio crescente nos bastidores da realidade latino americana.
Segundo L. Boff (2012), no Brasil, a ideia de libertação foi elaborada, primeiro, por Paulo Freire, no
campo da Educação. Depois, nos grupos de esquerda. A Igreja Católica seguiu
estes passos elaborando a libertação na perspectiva teológica. A primeira
grande obra deste novo método de fazer teologia foi a de Gustavo Gutierrez, Teologia da Libertação, cujo nome
tornou-se o denominador de todo movimento que se seguiu. O autor afirma: “Falar de teologia da
libertação é buscar resposta para a pergunta: que relação existe entre a
salvação e o processo histórico de libertação do homem?” (GUTIÉRREZ, 1979, p.
49). Antes disso ele também mencionou: ‘Trata-se de retomar os grandes temas da
vida cristã na radical mudança de perspectiva e dentro da nova problemática
levantada por esse compromisso. Isto é, o que busca a chamada “teologia da
libertação”’(GUTIÉRREZ, 1979, p.9).
Contexto eclesial que possibilitou o surgimento da Teologia da Libertação
Na década de sessenta a Igreja
viveu um momento de grande expectativas que se confirmou com o início,
desenvolvimento e conclusão do Concílio Vaticano II. Em 1958 fora escolhido o
Papa João XXIII, um papa de transição que levou a Igreja a outra grande
transição: da idade média para o mundo moderno.
O Concílio foi uma revolução na
Igreja. Diz-se que o Papa João XXIII afirmara no início de seu Pontificado: "quero
abrir as janelas da Igreja para que possamos olhar para fora, e para que as
pessoas possam olhar para dentro" (DIONNE, 2011). Se fora
este o desejo dele, o Concílio cumpriu seu papel. Ao encerrá-lo, o Papa Paulo
VI (1985, p. 506) trouxe presente em sua homilia que
nunca talvez, como no tempo deste
Concílio, a Igreja se sentiu na necessidade de conhecer, avizinhar, julgar
retamente, penetrar, servir e transmitir a mensagem evangélica, e, por
assim dizer, atingir a sociedade humana que a rodeia, seguindo-a na sua rápida
e contínua mudança. Esta atitude, nascida pelo fato de a Igreja, no passado e,
sobretudo neste século, ter estado ausente e afastada da civilização profana,
esta atitude, sempre inspirada pela essencial missão salvadora da Igreja,
esteve presente eficaz e continuamente no Concílio.
O Concílio colocou a Igreja
dentro do vagão da história. Um vagão puxado pela locomotiva da modernidade.
Neste vagão a Igreja vinha dialogar com o homem moderno, pois queria ser um
sinal vivo de esperança e do amor de Deus para com o homem atual, seus clamores
e suas dores. Portanto,
foi o Concílio que nos abriu o caminho da ‘volta
às fontes’; que nos ensinou que a tradição só é tradição se for viva e se fizer
viver; que, por isso mesmo, não se pode separar a palavra de Deus do ‘hoje’ no
qual tem de ressoar ser acolhida. E assim nos fez tomar consciência de que o
‘mundo’ faz parte do ser da Igreja (...) sem essa nova percepção do mundo e dos
seus problemas como parte da missão evangelizadora da Igreja, não teriam sido
possíveis as ‘teologias do mundo’ ou as ‘teologias das realidades terrestres’
que surgiram depois do Concílio e, de maneira própria e original entre nós, a
‘teologia da libertação’ (SUSIN, 2000,
p.53).
Depois do Concílio, veio a Conferência
de Medellin[6] (1968), a
segunda do episcopado latino americano e caribenho, que pode ser entendida
como a transposição do Concílio para esta realidade e uma verdadeira
revitalização da Igreja, gerada nestes contextos.
Leonardo Boff assim caracteriza este momento:
O fruto maior da Assembléia da Conferência Episcopal
Latino-Americana (CELAM) em 1968 foi ter dado à luz a Igreja
latino-americana como latino-americana. Os Documentos de Medellín
representam o "ato de fundação" da Igreja da América Latina (AL) a
partir e em função de seus povos e de suas culturas. (Aqui, para nos conformar
com o falar de Medellín, dizemos sempre e apenas "América Latina",
mas compreendendo também nessa designação todo o Caribe). Esses textos
constituem a "carta magna" da Igreja do Continente (BOFF, 1998, p. 568).
Junto surgem as Comunidades Eclesiais de
Base (CEBs)[7] e todo
um novo contexto de Igreja. Onze anos depois é realizada a Terceira Conferência
do episcopado latino americano e caribenho (1979) em Puebla. Esta, segundo L.
Boff
representou a confirmação das intuições fecundas de
Medellín, amadurecidas que foram na década sucessiva. Aquilo que em Medellín
era apenas esboçado, em Puebla é dito de maneira clara. Os traços que iriam
definir em seguida o perfil teológico-pastoral da Igreja do continente, como
veremos mais abaixo e que desde Puebla são chamados por todos e claramente de
"opção pelos pobres", "teologia da libertação" e
"Comunidades Eclesiais de Base", estão em Medellín bem presentes, mas
aí não estão ainda claramente delineados e nem explicitamente designados (1998, p. 572).
A teologia encontra solo fecundo
neste ambiente e brota como um grito de libertação. Na instância eclesial e
religiosa este grito é contra o elitismo clerical, a centralização romana, o
tradicionalismo infértil e a pregação alienante. Antes mesmo do Concílio
podemos mencionar a Ação Católica com seu método VER-JULGAR-AGIR e a sua
proposta para a compreensão crítica da realidade e impulsionou uma ação
transformadora. Assim o grito da nova teologia ultrapassa os ambientes
eclesiais para chegar à sociedade como um todo.
O próprio termo “libertação” em
teologia, nasce neste contexto eclesial e social que descrevemos. O Documento
de Medellin é o primeiro a usá-lo.[8]
Este encontrou um percurso na Popularum Progressio (1967) de Paulo VI que falava de um desenvolvimento integral das
nações. Libertação mostrou-se um termo melhor que desenvolvimento integral, uma
vez que mostrava menos dependência. Logo
depois o termo aparece na Evangelii
Nuntiandi (1975) também do mesmo Papa. Aí, libertação é sinônimo de esforço
e luta para superar o que oprime e espezinha os povos. Libertação como termo vai significar a Salvação de Jesus
que se dá na história (GALILEA, 1978, p. 21-23).
Contexto social que possibilitou o surgimento da Teologia da Libertação
O contexto social da América
Latina fora marcado, nesta época, pela invasão do capitalismo, aumento da
pobreza e o militarismo dominante através de regimes totalitários[9].
O marxismo se desenvolve e faz refletir saídas sociais alternativas ansiadas
pela América Latina (GONÇALVES, 2007). O
social é pensado por aqueles que não estão no poder. Este pensamento se
encontra com o teológico. Deste encontro nasce um modo de pensar em que está a
Teologia da Libertação.
Comblin (2000, p. 179) diz que há
uma continuidade entre todas as nações latino americanas e que todas passaram
mais ou menos pelas mesmas fases, embora não havendo simultaneidade entre todas
as nações. Com Fidel (1959-1973), em Cuba, nasceu a ideia de utopia possível
através de uma sociedade revolucionária. O continente pobre é instigado a
pensar numa vitória possível e isto mexe nas estruturas sociais e, até mesmo,
uma cultura nova parece despontar. Os golpes militares (1960-1980) que feriram
a democracia das nações, fez surgir outros gritos da população, mais defensivos
e resistentes. Não era mais o ideal das políticas socialistas, mas uma luta
contra a ideologia militar. Quando estes caem (1980-1990) volta o sonho da
sociedade igualitária e justa, e certo compromisso com o a liberdade
democrática conhecida, que luta com os sistemas econômicos. E assim, vem o contexto
neoliberal com ênfase na comunicação e novamente a ideia de que algo novo
estava por vir. Não conseguiremos entender a Teologia da Libertação
fora dessas circunstâncias. Antes
de qualquer elaboração sofisticada, ela foi a necessidade vital de pensar
teologicamente a experiência viva e concreta da comunidade eclesial. De uma
experiência que era, ao mesmo tempo, experiência de Deus e responsabilidade
pela realidade humana e social. Mais ainda, de uma tomada de consciência da realidade social
inseparável de uma experiência espiritual,
isto é, de uma exigência de conversão provocada por uma fidelidade maior ao Deus cristão,
ao Deus que, em Jesus Cristo, se tinha feito carne e história humana (PALÀCIO,
2000, p.54).
Embora nascida na América Latina, a Teologia da Libertação não ficou restrita
ao território eclesial latino-americano. Seja por sua aceitação ou rejeição,
sua proposta espalhou-se pelo mundo tornando-se um referencial do pensar
teológico que ilumina outros modos de pensar e viver a fé na Igreja e na
sociedade. Como afirma Libânio:
Toda teologia é “situada em algum lugar”, mas não
necessariamente “ordenada a esse lugar”. Pois pertence à estrutura mesma da
teologia se ao mesmo tempo “universal e particular”, “católica e local”. No
fundo, todo diálogo ou mesmo toda distinção entre a universalidade e
particularidade de toda teologia. A diferença nas particularidades pode servir
para fazer realçar a sua universalidade comum. Assim, a verdadeira Teologia da
Libertação lança suas raízes no solo das culturas de nosso continente, mas
abre-se em maravilhosos ramos para captar o oxigênio da história e do Espírito,
que não são particularidades de ninguém, mas criação de todos – história -, ou
dom a todos – Espírito. (1987, p.8).
TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO: Definição e Proposta
Santo Anselmo definiu teologia como fides quaerens intellectum (a fé buscando entender), a fé que busca
conhecer a verdade, a fé que busca a luz (BOFF, 1998, p. 25). A reflexão
teológica é a inteligência da fé (GUTIÉRREZ, 1979, p. 15). Crê-se em Deus que
se revelou e procura entender de que forma esta fé deve repercutir no cotidiano
da vida dos crentes, de acordo com sua realidade no diferentes âmbitos. “Deus é
o objeto desta ciência” (LIBÂNIO, 1996, p.106). Assim, a teologia é um esforço
humano para fazer e apresentar respostas às questões da fé que permeiam a vida
dos fiéis, por isso pode se falar em diferentes teologias, uma vez que mudam as
fontes que regulam a fé, os lugares e realidades.
No fundo, existe uma certeza que motiva a teologia: Deus
revelou-se a nós. A partir da revelação há uma palavra a ser dada, uma
realidade a ser refletida, respostas a serem procuradas. Neste desafio se
aventura esta ciência sem deixar ao mesmo tempo, de ser fé. Teologia é palavra
de homens para homens. Deus também fala na palavra humana. Este homem que fala
a partir da intelecção de sua fé procura traduzir o mistério de Deus,
consciente de que sua fala é deficiente no que concerne à pessoa de Deus.
Liberdade e libertação
É sempre difícil dar a definição de algo sem roubar ou
acrescentar-lhe algo.[10]
No entanto, falar de algo é sempre definir. Sobre Teologia falamos acima.
Resta-nos falar sobre liberdade e libertação antes de procurar definir Teologia
da Libertação.
Liberdade é um conceito amplamente estudado e discutido em todos os
tempos. A razão disso está no homem, que
buscando a compreensão de si e do universo, pergunta pela liberdade, tal como
um sedento, que não pode esquivar-se da ânsia pelo saciar de sua sede[11].
O homem quer viver do modo mais livre que lhe for possível, por isso se
pergunta pela liberdade, tanto individual, como coletiva. Disso decorre uma
imensa variedade de compreensões acerca do assunto[12].
Vale mencionar que a pergunta pela liberdade vem sempre posterior ao desejo de
libertação (ARENDT, 1998, p.23). Tal libertação vê a cadeia específica e o que é preciso para rompê-la[13].
Por isso, em cada situação há um modo próprio de buscar a libertação e entender
o que seja a liberdade.
Apesar de não haver consenso quanto à definição de liberdade, religiões,
culturas e civilizações, com suas leis, regimentos e crenças se fundamentaram e
construíram seus códigos morais e éticos sempre a considerando como critério
indispensável. Também, instrumentos de poder e de domínio se fixaram gerando
guerras, atos desumanos e até mesmo atos heroicos em favor do bem comum.
O Dicionário de Filosofia de Nicola Abbagnano (1998, p.605ss)
traz o conceito liberdade como tendo três significados, apresentados como
fundamentais, e que corresponderiam a três concepções que se sobrepuseram ao
longo de sua história. Apresenta elencando que
a primeira é a liberdade absoluta, ou seja,
incondicional e, portanto, sem limitações nem graus. Assim, é livre aquilo que
é causa de si mesmo. Sua primeira expressão encontra-se em Aristóteles.
A segunda concepção fundamental identifica liberdade com necessidade. O
conceito de liberdade a que se refere é ainda o de causa sui; contudo,
como tal, a liberdade é não atribuída à parte, mas ao todo: não ao indivíduo,
mas à ordem cósmica ou divina, à Substância, ao Absoluto, ao Estado. A origem
dessa concepção está nos estoicos. A terceira concepção apresenta a liberdade
como medida de possibilidade. Enquanto as duas primeiras possuem um núcleo
conceitual comum, a terceira concepção não recorre a esse núcleo porque entende
a liberdade como medida de possibilidade, portanto escolha motivada ou
condicionada. Livre, nesse sentido, não é quem é causa sui ou quem se
identifica com uma totalidade que é causa sui, mas quem possui, em
determinado grau ou medida, determinadas possibilidades. Platão foi o primeiro
a enunciar esse conceito.
O
cristianismo apresentou a ideia cristã de que todos os batizados são livres[14]
na liberdade conquistada por Cristo em sua morte e ressurreição[15].
Esta liberdade se dá em relação ao pecado, raiz de todo mal no mundo. Não é uma
liberdade física, social especificamente, mas uma liberdade que é a fonte para
a libertação de toda cadeia, fonte para a vida plena (Jo 10, 10). Em Teologia
da Libertação, a palavra libertação
pretendia, exatamente, exprimir uma nova consciência histórica, ou seja,
um modo novo de compreender a totalidade histórica e, sobretudo, uma forma nova de se posicionar em relação a
ela, que se gestou a partir da tomada de
consciência das desigualdades sociais, culturais, políticas e econômicas que
marcam a vida das maiorias em grande parte dos países do mundo (OLIVEIRA, 1998,
p. 273).
O ser humano, sujeito desta libertação[16],
é convidado a construir uma sociedade livre, com direitos e deveres iguais, com
igualdade de condições. A fé vem iluminar esta libertação e possibilitar que as
pessoas encontrem os instrumentos para a sua própria humanização que acontece
na liberdade.
Teologia da Libertação: definição
Na grande obra de Gustavo Gutiérrez, que deu o nome ao novo modo de
fazer teologia da América Latina, Teologia
da Libertação (1971), o autor define essa teologia como sendo “uma
reflexão, à luz da Palavra do Senhor, aceita na fé, sobre o complexo processo de
libertação vivido pelos povos neste continente” (GUTIÉRREZ, 1979, p. 48). Boff (1985, p. 12) diz que
Teologia da Libertação representa mais
do que simplesmente teologia. Representa a Igreja de todo um continente e uma
Igreja envolvida com o processo histórico de um povo. Por trás da Teologia da
Libertação há gente, há luta, há vida. Ela é sintoma de um processo, que é ao
mesmo tempo eclesial e social. Atrás dela há um povo e não livros. Trata-se da
“pequena diferença” que separa a teoria da prática.
Os pobres e marginalizados constituem o lugar teológico deste
modo de refletir a fé[17],
uma vez que “a TdL pretende responder teologicamente à pergunta da libertação
dos povos dependentes em relações aos países centrais, das camadas dependentes
diante das estreitas faixas da sociedades ricas e desenvolvidas” (LIBÂNIO,
MURAD, 1996, p.163). Por isto apresenta uma crítica à sociedade, à própria
Igreja a partir dos pobres, entendido como “os preferidos de Deus”. Esta
teologia recebeu este nome, pois “abordava a temática da libertação. Mereceu o
nome de teologia porque versava sobre a fé cristã. Surgiu na América Latina,
porque aí se encontrou uma Igreja inserida e em reflexão dentro da situação
opressora trabalhada por surtos libertários” (LIBÂNIO, MURAD, 1996, p.168).
Teologia da Libertação: proposta
Como toda reflexão, a Teologia da Libertação propõe um
caminho. Esta proposta esta alicerçada nos seus princípios e nas suas metas,
bem como no caminho por ela mesmo feito. Assim,
a teologia da libertação nos propõe
talvez não tanto novo tema para a reflexão quanto novo modo de fazer teologia. A teologia como reflexão crítica da
práxis histórica é assim uma teologia libertadora, teologia da transformação
libertadora da história da humanidade, portanto também da porção dela – reunida
em ecclesia – que confessa
abertamente Cristo. Teologia que não se limita a pensar o mundo, mas procura-se
situar-se como um momento do processo através do qual o mundo é transformado:
abrindo-se – no protesto ante a dignidade humana pisoteada, na luta contra a
espoliação da imensa maioria dos homens, no amor que liberta, na construção de
nova sociedade, justa e fraterna – ao dom do reino de Deus (GUTIÉRREZ, 1979, p.
27).
Quis a Teologia da Libertação, oferecer um novo jeito de refletir a fé,
com resposta de libertação para os pobres e oprimidos, com uma mística e uma
prática enraizadas na realidade.[18]
O relacionamento com Deus torna-se mais horizontal do que vertical. A realidade
é o outro livro a ser lido, com tanta atenção quanto à Sagrada Escritura.
“Sonha com transformações possíveis e com relações humanas nas que o ser humano
é amigo de outro ser humano, e não o seu carrasco. A prática social pode
transformar o sonho em realidade histórica” (LIBÂNIO; MURAD, 1996, p.168). Isto
é sua proposta! ‘Trata-se de retomar os grandes temas da vida cristã na radical
mudança de perspectiva e dentro da nova problemática levantada por esse
compromisso. É isto o que busca a chamada “teologia da libertação”’ (GUTIÉRREZ,
1979, p.9).
Leonardo Boff (1980, p. 54) escreveu: “temos uma clara opção de fundo: o
que deveras interessa não é a teologia da libertação, mas a libertação
histórica de nosso povos. Para tal libertação deve servir a teologia da
libertação”. Este movimento latino americano não nasce voltado para si. Seus
olhos fixos em Cristo e na ação divina encontraram a realidade sub-humana e
quiseram transformá-la. Viram que isto não era suficiente. É preciso uma
ruptura, uma libertação. Temos um instrumento para isto: a teologia. A fé o
povo já tem. Basta que lhe ofereçamos uma compreensão mais profunda, mais ampla
e motivadora. Suficiente é mostrar que Deus quer esta libertação, que ele não
se acostumou com essa realidade e não se conforma com o status quo opressor, muitas vezes amparado pelas reflexões nas
Igrejas. Por isso
A Teologia da Libertação se propõe fazer de todos os
cristãos, também dos pobres sócio-históricos, pobres evangélicos; ela procura,
à luz dos desafios que os pobres concretos colocam, pensar e agilizar a
dimensão libertadora da fé para que já dentro da história se antecipem os
frutos do Reino de Deus, que são principalmente o reconhecimento do Pai, a
acolhida da filiação divina, a vida e a justiça para todos e a fraternidade
universal (BOFF, C. BOFF, L. 2001, p. 81).
Podemos
dizer de diversas formas as propostas da Teologia da Libertação. Sempre haverá
mais a comentar. Em síntese é preciso dizer: a Teologia da libertação entendeu
que a teologia tradicional não estava correspondendo ao anseio de vida plena do
povo pobre latino americano e desafiou-se a fazer isto em comunhão com as
realidades mais sofridas, tendo como objetivo ser veículo da graça divina
libertadora e promotora da vida. Propôs-se a ser uma teologia para os pobres, a
partir dos pobres e com os pobres, a fim de corresponder à sua vocação natural:
falar e refletir sobre os sinais de Deus.
MÉTODO DA TEOLOGIA DA LIBERTAÇÃO
Toda ciência possui um método. Método “é o caminho pelo qual
se chega a determinado resultado, ainda que esse caminho não tenha sido fixado
de antemão de modo refletido e deliberado” (HEGENBERG, 1976). Pode ser
entendido ainda, como “a ordem que se deve impor aos diferentes processos
necessários para atingir um determinado fim. É o caminho a seguir para chegar à
verdade nas ciências” (JOLIVET, 1979). A teologia é uma ciência. Segundo
Trujillo Ferrari (1974, p. 179), “ciência é todo um conjunto de atitudes e de
atividades racionais, dirigida ao sistemático conhecimento com objetivo
limitado, capaz de ser submetido à verificação”. Em se tratando de Teologia,
encontramos um problema quanto à verificabilidade do objeto, uma vez que Deus
se compreende pela fé e não por algo material, sujeito a procedimentos
verificáveis.
No entanto, o desenvolver da própria ciência trouxe luz a uma
visão de conhecimento verdadeiro bem mais amplo do que a maneira rigorosa de
fazer ciência. “Uma vez aceita pluralidade de jogos linguísticos, dos diversos
saberes, das diferentes maneiras de conduzir o próprio método, de pautar seu
rigor teórico e de fazer parte de uma comunidade científica como expressão
moderna de ciência, a teologia faz-lhe pleno jus” (LIBÂNIO; MURAD, 1996, p.
88).
A teologia da Libertação possui um
método próprio. Este método é o VER-JULGAR-AGIR. Compreendê-lo é fundamental
para compreender esta teologia que traz como ideal refletir a fé com os pés no
chão (BOFF, 1984, p.12). O teólogo Clodovis Boff, em sua tese de
doutorado sobre o tema da Teologia e prática: teologia do político e suas mediações[19]
trouxe contribuições muito decisivas quanto ao método (TEIXEIRA, 2006, p. 27-65).
Para ele,
três mediações entravam na
construção teórica da TdL: a mediação sócio-analítica (MSA), a mediação
hermenêutica (MH) e a mediação prática (MP). O recurso às “mediações” servia
amplamente ao projeto proposto por Clodovis Boff de clarear o objeto da TdL, o
seu modo específico de apropriação teórica e a relação entre teoria e práxis.
Mas para tanto, deveria ser superada a visão limitada e estática de teologia,
entendida como “depósito” de conhecimentos, em favor de uma visão mais
dinâmica, ou seja, de teologia processual, de teologia como prática teórica. Um
postulado fundamental regia toda a discussão e mostrava a plausibilidade da
extensão do campo teórico da teologia: de que o não teológico pode tornar-se
teológico mediante uma operação teológica determinada. Justificava-se, assim, a
validade da dinâmica teológica da TdL, que tinha por objeto material uma
realidade não-teológica, o Político, mas que mediante um processo teórico
específico ganharia uma apropriação teológica. (TORRES; TEIXEIRA; EGGERT; SAMPAIO (orgs.). 2006 p.
28).
Veremos
como é este método e a tarefa a qual se propõe. De início “é preciso que fique
claro isto: na raiz do método da Teologia da Libertação se encontra o laço com
a prática concreta. É dentro dessa dialética maior de Teoria (da fé) e Práxis
(da caridade) que atua a Teologia da Libertação” (BOFF, L.; BOFF, C. 2001, p. 42). Trata-se
da sua própria identidade .
Ver
O primeiro passo no processo
metodológico da Teologia da Libertação é o VER[20]
ou momento pré-teológico (LIBÂNIO; MURAD, 1996, p. 174), ou ainda, o momento da
mediação sócio-analítica (MSA)[21].
O teólogo está inserido numa situação social, religiosa, cultural e política
que fala por si só. A palavra da fé precisa ir de encontro a esta realidade.
Mais do que isso: tem a missão de ler os sinais de Deus nos traços da população
e de sua história, muitas vezes marcada pelo sofrimento e a exploração. VER é a
atitude do teólogo que recolhe naquilo que pode entender dos fatos e situações,
a matéria para seu fazer teológico, por isso é pré. E desse modo,
Ao partir de uma situação na qual se experimenta Deus
no pobre e em sua luta, o teólogo vê-se solicitado a conhecer melhor essa
situação. Defronta-se com dois caminhos: o caminho da experiência comum, do
sentido comum, da observação “imediata” ou o caminho da análise científica da
realidade. (LIBÂNIO; MURAD, 1996, p. 174).
A Teologia da Libertação fez uso da análise marxista com elementos
que permitem captar a lógica opressora do sistema capitalista. Para a mediação
sócio-analítica a reflexão marxista contribui uma vez que leva em conta a luta de classes para a libertação das
massas.
A realidade social prepara o chão onde a semente da reflexão
teológica germinará. VER é estar sensível à ação de Deus nos movimentos
populares, nas manifestações culturais, no grito dos excluídos, na questões
apresentadas pelas novas gerações, no movimento da história. O teólogo não faz
isto de qualquer forma, mas utilizando de todos os possíveis instrumentos da
ciência e do conhecimento existente. É uma relação de empatia fértil para a
reflexão teológica. “A mediação sócio-analítica olha para o lado do mundo do
oprimido. Procura entender porque o oprimido é oprimido” (BOFF, L.; BOFF, C.
2001, p. 44).
Julgar
O segundo passo no processo
metodológico da Teologia da Libertação é o JULGAR ou momento propriamente teológico, ou ainda, o momento da mediação hermenêutica
(MH) (TEIXEIRA, 2006, p. 27-65). Depois de ter se apropriado da mediação sócio
analítica, o teólogo precisa interpretar o que VIU, àquilo que a realidade lhe
possibilitou compreender. A Teologia da Libertação lhe convoca a conectar-se
com a Tradição teológica, com a primazia da fé em relação com a Igreja e a
Sagrada Escritura. “A mediação hermenêutica olha para o lado do mundo de Deus. Procura ver
qual é o plano divino em relação ao pobre” (BOFF, L.; BOFF, C. 2001, p, 44). É o momento da Razão Teológica. A ciência ganha vida, sem estar presa ao
método rigoroso das ciências.
Respeitando a fonte, a própria
vida que acontece nas periferias do mercado capitalista e dos acordos
multinacionais, seriamente se faz a reflexão através da interpretação e conexão
entre a fé e a realidade tal qual é, no intuito de fomentar libertação, crendo
na ação divina e correspondência humana. “O momento especificamente teológico
consiste em trabalhar a pergunta, levantada pela situação, analisada com mediações
sociais, à luz da Revelação divina. A teologia elabora já um dado da realidade
devidamente interpretado pelos instrumentos da análise social” (LIBÂNIO; MURAD, 1996, p.
174).
Agir
O terceiro passo no processo
metodológico da Teologia da Libertação é o AGIR ou momento práxico, ou ainda, o momento da mediação prática (MP). Aqui temos o cume da proposta da
Teologia da Libertação: a prática. “A mediação prática, olha para o lado da ação e tenta
descobrir as linhas operativas para superar a opressão de acordo com o plano de
Deus” (BOFF, L.; BOFF, C. 2001, p, 45). Tudo o que foi VISTO, que foi
JULGADO numa reflexão séria e metódica convoca à uma AÇÃO comprometida na
transformação da sociedade. Convoca à uma ação que liberta e possibilita o
Reino de Deus. É o momento da ação pastoral, pois
a TdL quer ser uma reflexão crítica da própria prática
teológica, das práticas pastorais das comunidades cristãs e das práticas
politicas-sociais do cristão e do ser humano como tal. Portanto, temos três
níveis de práxis; prática intrateológica, intraeclesial e sociopolítica. A
teologia não se pode restringir somente a alguma delas (LIBÂNIO; MURAD, 1996, p. 174).
A prática intrateológica quer referir-se
ao dever do teólogo de contribuir com a teologia em si. A intraeclesial faz
menção ao dever com a vida da Igreja. O teólogo deve propor e questionar a
Igreja para que ela continue intermediando a vida de fé dos fiéis de modo fiel
ao Evangelho. E a sociopolítica é a intervenção na própria sociedade com os deveres
da fé refletidos em consonância com os acontecimentos sociais. A teologia tem
uma palavra à sociedade nas suas mais diversas dimensões. Deus é presente na
luta do povo. Ele ouve e fala ao homem real, espoliado e manipulado pelos
contratos do capital. Para ser verdadeiramente teologia, faz-se necessário a
mediação prática.
OPÇÃO PREFERENCIAL
PELOS POBRES
Quando uma pessoa ama outra,
procura de todos os modos saber as preferencias da amada a fim de lhe agradar e
corresponder ao amor recebido. O movimento do amor é de sentimento, inteligência
e ação. Se algo ou alguém é preferido da pessoa amada, logo passa ser preferida
também do amante.[22]
Por isso o amante procura conhecer e estabelecer relação semelhante. O amor não
diminui na partilha. O amor não se esgota ao dar de si a alguém mais. Amar é
tocar o infinito que se desdobra cada
dia. Quanto mais se ama e se torna oblação no amor, mais amor jorra a fonte do
coração, pois o amor é o dom dos dons.
Deus é amor e ama. Seu amor não
tem limites, mas tem preferência. Deus prefere os pobres como a mãe prefere o
filho frágil. Não é um amor excludente, mas inclusivo. Eis a regra para amar e
servir a Deus: vender tudo e dar aos que nada tem, pois estes são preferidos
por Deus (Lc 18, 22). Quando Deus quis
vir a terra tomou a condição dos seus preferido e nasceu pobre numa gruta da
Judeia deu-nos um recado no que se refere a suas preferências. Sua vida simples
e sua atitude missionária no anúncio da Boa Nova e defesa dos pequeninos
evidenciaram o carinho de Deus pelos marginalizados e oprimidos.[23]
Por fim, sua condenação e morte injusta, colocaram-no entre o último dos
homens. Deus, na Cruz, desceu a condição mais pobre possível: nu, faminto,
sedento, ferido, abandonado, injustiçado, deteriorado, Cristo comungou da mais
triste realidade humana.
A Teologia da Libertação, como
toda teologia, é um falar do homem sobre Deus em que reflete seu amor e a busca
do amor de Deus. Assim, compreendendo os pobres como preferidos de Deus[24],
tal modo de fazer teologia entende que é aí que está o rosto mais original de
Deus e onde ressoa sua voz. Portanto,
podemos entender a Teologia da
Libertação como aquela reflexão de fé da Igreja que tomou a sério a opção
preferencial e solidária com os pobres. É
a partir deles e junto com eles que a Igreja quer atuar de forma
libertadora. Esta opção não é interesseira e política, como maneira de a
Igreja-instituição se colocar ao lado da força histórica emergente/; as classes
populares cada vez mais decisivas na condução da história. Ela o faz em virtude
de motivações próprias, inerentes à própria fé cristã (BOFF, L.; BOFF, C. 2001, p. 45).
Dentre
todos as possíveis manifestações de Deus, a Teologia da Libertação faz uma
opção: o pobre. Esta opção está fundamentada na própria interpretação teológica
de que Deus tem preferência pelos pobres, como afirmamos acima.
O pobre
no Terceiro Mundo, significa, de
fato, estar perto da morte lenta produzida pelas estruturas injustas e
opressoras, e da morte violenta originada pela opressão contra os pobres e
pelas guerras que são produzidas em países pobres justamente quando estes
querem se libertar de sua pobreza. Pobreza é, então, a negação formal e a
privação do mínimo a que a humanidade aspira e sobre o que gira toda a
história: a vida (SOBRINO, 1994, p. 52-53).
Em Mateus 6, 33 está expresso a missão de todo cristão:
“buscai primeiro o Reino de Deus e a sua justiça”. Assim toda atividade do
cristão deve-se configurar a esta convocação de Jesus.[25]
Com a teologia não é diferente. Sonha-se e se abre caminhos para que o Reino de
Deus esteja presente em cada situação. Não há o Reino sem a justiça que
igualmente deve ser buscada. Justiça em terras sofridas se chama liberdade, democracia,
direito à terra, moradia digna, alimentação, saúde, escola, segurança,
trabalho. Por isso uma teologia que se comprometa com o Reino de Deus deve
promover à vida do pobre e libertar a sociedade das cadeias do egoísmo e do
materialismo para que todos vivam e vivam plenamente (Jo 10, 10). O pobre é
sinal deste reino pois clama uma atitude concreta dos cristãos[26]
e onde
faz-se a experiência do Reino de
Deus. E é este Reino que nos impõe exigências de esperança, de práticas de
caridades libertadoras, de decisões urgentes e inadiáveis. (...) O pobre
enquanto amado de Deus é sinal do já
do Reino, que está perto, aí onde está o pobre; o pobre é também sinal da
distância, do ainda não do Reino,
pois sua existência denúncia o pecado, a injustiça, a falta de fraternidade.
Na sua paradoxal condição – amado de Deus e fruto da injustiça, o pobre
mediatiza a experiência de Deus da vida. Pois o Deus da vida se faz próximo do
povo para que ele viva, e a não-vida do pobre revela pela via do contraste a
Deus como vida (LIBÂNIO, 1987, p. 111).
Solidarizar-se com o pobre é cultuar e
comungar com Cristo (BOFF, L.; BOFF, C. 2001, p. 74). Como em o 25, 31-46, Cristo diz: “sou
eu quem sofro”. No pobre está Cristo como filho de Deus desfigurado,
como “humilhado e ofendido” do sentimento popular, como negro, o índio e a
mulher (Cf. BOFF,
L.; BOFF, C. 2001, p.
51-55). A pobreza. seja como vicio, como
atraso, como opressão é o chão onde germina a fidelidade evangélica. Com os
pobres e nos pobres é possível fazer uma experiência profunda e fecunda de
Deus, por isso “a TdL lança suas raízes e haure sua inspiração última na
experiência espiritual de Deus como o Deus dos pobres e na experiência do
pobre, como lugar de encontro com Deus, como mediação privilegiada de Deus” (LIBÂNIO,
1987, p. 115).[27] É uma teologia latino americana
elaborada num contexto cristão de
pobreza, de dependência, de subdesenvolvimento. Sua preocupação básica é a
justiça, a libertação dos oprimidos. Seu interlocutor não é primariamente o
não-crente (o povo latino-americano mantém uma forte religiosidade), mas sim o
'não-homem', aquele que a marginalização e a miséria mantêm numa situação
subumana (GALILEA, 1978, p. 17).
Esta escolha tem uma missão: dignificar a vida do pobre e com
ele buscar libertação. Não é uma opção para si mesma que faz a Teologia, mas
para o Reino de Deus e a promoção do pobre, a promoção da vida.
Igreja dos pobres
Para a Teologia da Libertação, os pobres estão no centro
(FAUS, 2000, p.193). Assim, ela quer propor que a Igreja seja uma Igreja dos Pobres que
pode significar duas coisas: ou que a comunidade dos
cristãos se compromete com a libertação dos pobres, mas a partir de uma
situação mais “confortável”, exterior ao mundo dos pobres e dos marginalizados;
ou que a Igreja entrega sua mensagem de libertação “a partir” dos pobres,
inserida ela mesma entre eles (GALILEA, 1978, p. 66).
O Atos dos Apóstolos mostra
este comprometimento da Igreja nascente com os pobres. A Igreja é pobre, vive
como pobre.[28] Por
isso em Gálatas 2, 10, Paulo fala da única recomendação dos Apóstolos a ele:
Por isso, Tiago, Pedro e João, considerados
como colunas, reconheceram a graça que me fora concedida, estenderam a mão a mim e
a Barnabé em sinal de comunhão: nós trabalharíamos com os pagãos, e eles com os circuncidados. Eles pediram apenas que nos lembrássemos dos pobres, e isso eu tenho procurado fazer com muito cuidado.
É a partir dos pobres que nascem novos ministérios[29],
que muda-se a configuração da comunidade, que se organizam mobilizações[30].
Em Efésios 4, 28b está explícito o compromisso do cristão com o
pobre: “ocupe-se trabalhando
com as próprias mãos em
algo útil e
tenha assim o que repartir
com os pobres”. Dar atenção ao pobre é a identidade da religião
cristã: “Religião pura e sem mancha diante de Deus,
nosso Pai, é esta: socorrer os
órfãos e as viúvas em
aflição[31],
e manter-se livre da
corrupção do mundo”
(Tg 1, 27). Em Puebla a Igreja latino-americana retoma o discurso sobre a opção
preferencial pelo pobre. Ao fazer isto
a Conferência
de Puebla assumiu a herança de Medellín criando a expressão "opção
preferencial pelos pobres", exatamente estas três palavras - pobre,
preferência, opção - remeteu aos três conceitos distintos de pobreza material,
pobreza espiritual e pobreza como compromisso. A missão da Igreja
latino-americana vai se definindo então, em torno desse eixo fundamental: uma
missão a partir dos pobres (das vítimas da pobreza), que anuncia a Palavra que
se fez carne nos pobres, realizada por uma Igreja existencialmente pobre. Isso
se expressa também na estrutura das três grandes partes do Documento de
Medellín: promoção humana, evangelização e Igreja (RASCHIETTI, 2008, p. 17).
A Igreja de
Cristo é a Igreja dos pobres. Sua preocupação é a evangelização. Evangelizar e
proclamar a ressurreição. Ressurreição é a libertação da morte e de tudo o que
impede a vida de viver. Ressurreição é a vida resgatada por Deus das trevas a
que foi submetida. Optar pelo pobre "é condição necessária e irrenunciável
do caráter evangélico da ação da Igreja" (CNBB, 2008, 194). Optar pelo
pobre é optar pela ressurreição.
A TEOLOGIA
DA LIBERTAÇÃO: ATUALIDADE E PERSPECTIVAS
A Teologia da Libertação completou quarenta anos em 2011. Já não é uma
criança, nem uma jovem da qual pode se esperar qualquer coisa. Está
amadurecida. Teve a receptividade própria da novidade, hora calorosa, hora
destrutiva. Dentro e fora da Igreja, a Teologia da Libertação foi elogiada e
atacada e assim amadureceu, pois exigiu de seus pensadores e expoentes uma
atitude fiel aos princípios que a fazem surgir. Hoje é
reconhecida como corrente teológica com fundamentos e propostas claras,
fundamentadas e objetivas. Continua sofrendo as mesmas represálias por certos
setores da Igreja. Como afirmara Epicuro, “os grandes navegadores devem sua
reputação aos temporais e tempestades” (GAGO, 2012). Foi por viver todas estas
tormentas e manter-se dinâmica que a Teologia da Libertação continua viva, atuante e reconhecida. Ao contrário
do que alguns afirmam,
A Teologia da Libertação não morreu. Ela
é atualmente mais urgente do que quando surgiu no final dos anos 60 do século
XX. Apenas ficou mais invisível pois saiu do foco das polêmicas que interessam
a opinião pública. Enquanto existirem neste mundo pobres e oprimidos haverá
pessoas, cristãos e Igrejas que farão suas as dores que afligem a pele dos
pobres, suas as angústias que lhes entristecem a alma e seus os golpes que lhes
atingem o coração. Estes atualizarão os sentimentos que Jesus teve para com a
humanidade sofredora (BOFF, 2011).
É
verdade que uma nova geração de estudantes de teologia e de teólogos parece
buscar o sentido para a reflexão da fé em outras fontes como a liturgia romana,
a dogmática católica, o Magistério atual. A própria fé do povo comum teve
mudanças expressivas. As pessoas de nossas comunidades estão tendo como
referencia religiosos e pregadores que
outrora não se tinha. A própria relação de fé comunitária nas grandes cidades
tornou-se diferente. Se reúne para o futebol, se reúne para os shows de
artistas promovidos pela mídia, se reúne em romarias piedosas, mas não se reúne
em lutas populares, em romarias do trabalhador (por exemplo), em encontros
bíblicos, em celebrações nas comunidades pequenas das periferias. A teologia é
afetada por isso, não há como fugir.
A mídia não fala mais, uma vez que
não é o assunto midiático do momento. Há um consenso ideológico e induzido de
que aquilo que não é mostrado na mídia, está morto. Tudo isso faz parte de uma
luta contra as propostas desta Teologia. Se ninguém que está na liderança da
sociedade a valoriza, está pronta a morrer. É diante deste quadro que nos
perguntamos: qual é o futuro da Teologia da Libertação? L. Boff responde:
Ela tem o futuro que está reservado aos
pobres e oprimidos. Enquanto estes persistirem há mil razões para que haja um
pensamento rebelde, indignado e compassivo que se recusa aceitar tal crueldade
e impiedade e se empenhará pela libertação integral. Ela não terá lugar dentro
do atual sistema capitalista, máquina produtora de pobreza e de opressão. Ela
só poderá existir na forma de resistência, sob perseguições, difamações e
martírios (BOFF, 2011).
Leonardo
Boff também fala sobre o futuro da Teologia da Libertação dentro da Igreja
Católica Romana, âmbito em que sempre encontrou grande represarias. Assim se
expressa o autor
Mantido o atual sistema, cujo eixo estruturador é a sacra potestas, o poder sagrado,
centralizado somente na hierarquia, ela só poderá ser uma teologia no cativeiro
e relegada à marginalidade. Ela é disfuncional ao pensamento oficial e ao modo
como a Igreja se organiza hierarquicamente: de um lado o corpo clerical que
detém o poder sagrado, a palavra e a direção, e do outro, o corpo laical, sem
poder, obrigado a ouvir e a obedecer. Na esteira do Concílio Vaticano II, a
Teologia da Libertação se baseia num conceito de Igreja comunhão, rede de
comunidades Povo de Deus e poder sagrado como serviço. (...) Mas na Igreja
instituição, apesar de suas graves limitações, sempre há pessoas, homens e
mulheres, padres, religiosos e religiosas e bispos que se deixam tocar pelos
crucificados da história e se abrem ao chamado do Cristo libertador. Não apenas
socorrem os pobres, mas se colocam do lado deles e com eles caminham buscando
formas alternativas de viver e de expressar a fé (BOFF, 2011).
Assim
a Teologia da Libertação mostra-se profética e se abre à outras perspectivas.
Silenciada oficialmente por algum tempo na Igreja Católica Romana, encontrou espaços em outras
Igrejas ecumênicas que tem a mesma opção preferencial pelos pobres. Vive e dinamiza a vida a partir da fé nas bases populares, nos religiosos sem fama,
nas lideranças leigas que habitam o mesmo chão de seus companheiros. Claro,
se alguém quiser encontrar a Teologia a Libertação não vá às faculdades
e institutos de teologia. Ai encontrará fragmentos e poucos representantes. Mas
vá às bases populares. Ai é seu lugar natural e ai viceja vigorosamente. Ela
está reforçando o surgimento de um outro modelo de Igreja mais comunitário,
evangélico. Compreenderá que no binômio Teologia da Libertação, o decisivo não
é a Teologia, mas a Libertação real e histórica, porque esta e não aquela é um
dos bens do Reino de Deus (BOFF, 2011).
É
este tipo de visão que faz a Teologia da libertação não perder sua vocação
fundante. O que é importa, no fim de tudo, não é Teologia da Libertação, mas a
libertação da Teologia presa à cavernosidade dos interesses particulares. O
Reino é dom universal, por isso na sua construção não podem prevalecer
interesses alheios a ele. Com os pés no chão de cada realidade, passa-se a
refletir na busca dos mesmos horizontes. Assim a genuína Teologia da Libertação
acontece no movimento da vida sofrida em busca de libertação, de vida plena
conforme o Evangelho de Cristo Jesus.
Debates atuais
Recentemente, uma publicação do Frei Clodovis Boff
intitulada “Teologia da Libertação e volta ao fundamento” surpreendeu os atuais
expoentes desta Teologia e os teólogos como um todo. Surpreendeu pelo fato de
ser ele, um dos que mais escreveu e fundamentou as opções e reflexões da
Teologia da Libertação, estar criticando-a. Neste artigo da Revista Eclesiástica
Brasileira (REB), em agosto de 2007, C. Boff afirma:
Quer-se mostrar aqui que a Teologia da Libertação
partiu bem, mas, devido à sua ambigüidade epistemológica, acabou se
desencaminhando: colocou os pobres em lugar de Cristo. Dessa inversão de fundo
resultou um segundo equívoco: instrumentalização da fé “para” a libertação.
Erros fatais, por comprometerem os bons frutos desta oportuna teologia. Numa
segunda parte, expõe-se a lógica da Conferência de Aparecida, que ajuda aquela
teologia a “voltar ao fundamento”: arrancar de Cristo e, a partir daí, resgatar
os pobres”.
O teólogo critica, em suma, três pontos
que ele entendeu como assumidos na Teologia da Libertação: o primado dos pobres, a instrumentalização da
fé e a pouca importância da transcendência. O que já se esperava, aconteceu.
Tais colocações suscitaram
reação por parte de teólogos da Libertação que se mostraram contrários à tal opinião.
Luiz Carlos Susin e Érico Hammes responderam:
Em réplica,
aqui sustentamos que o pobre não é apenas uma decorrência cristológica, mas
antes um “lugar teológico” privilegiado para compreender Cristo e Deus do ponto
de vista da teologia cristã, inclusive seu teste de veracidade. O artigo debate
também a metodologia de Clodovis, que segue uma lógica linear, de sabor
escolástico, e não considera suficientemente a complexidade do círculo
hermenêutico e a tradição bíblica que obriga a incorporar o paradoxo e o
escândalo da quenose como categoria bíblica. Por fim, a categoria de quenose
não pode se ater a uma memória textual, mas entra em círculo hermenêutico com a
quenose atual dos pobres e de todos os que estão em situação de
vulnerabilidade, aos quais é dado o Reino de Deus (2008, p. 277-278)
Leonardo Boff, respondeu em outro longo artigo, tentando
refutar as afirmações feitas pelo irmão Clodovis Boff, e afirmou:
Minha suspeita é de que as
criticas suscitadas por Clodovis Boff à Teologia da Libertação forneçam às
autoridades eclesiásticas locais e romanas as armas para condená-la novamente
e, quem sabe, bani-la definitivamente do espaço eclesial. Como as criticas
devastadoras provém de dentro, de um de seus mais reconhecidos formuladores,
elas podem prestar-se a tal intento infeliz. A impressão que sua argumentação
provoca é de alguém que se despediu e já emigrou da Teologia da Libertação,
daquela 'realmente existente' que, na verdade, é a única que existe e se
pratica nas Igrejas. Esta teologia é atacada em seu núcleo definidor porque
cometeu, segundo ele, um 'erro de princípio, grave para não dizer fatal...falha
'mortal' que, levada a termo, termina pela morte da Teologia da Libertação'
(REB 1004 e 1006). (...) Tais acusações são de grande monta e nos lembram os
textos acusatórios de figadais inimigos da Teologia da Libertação dos anos 80
do século XX (BOFF, 2008, p. 701-702).
Clodovis
pôde escrever uma réplica às afirmações dos teólogos da Libertação que atacaram
seu artigo. Nela sustenta que "o
fundamento da teologia é e só pode ser Cristo e não outro, mesmo o pobre".
Além disso, segundo ele, permanece e se confirma, na base da Teologia da
Libertação, "uma perigosa e nefasta ambigüidade", e, por isso,
"é preciso repropor a TdL, assentando-a, sem equívocos, no fundamento da
fé" (BOFF, 2008, p. 892-927).
Todo esse movimento mostra a vida
que corre nas veias da Teologia da Libertação. Na dialética dos argumentos, a
favor e contra, ela segue seu percurso propondo o saber da fé como algo que
brota do chão, do coração, da inteligência, das mãos e dos pés de quem ousa
fazer a experiência de fraternidade entre os pobres, no meio do mundo. Convoca
a Igreja e pensar e repensar sua prática, no intuito de que o Reino de Deus
seja sempre prioridade.
Conflitos
recentes em torno da
Teologia da Libertação
A relação entre teólogos e a
Igreja nem sempre foi tranquila. De um lado vê-se a Igreja com a missão de
conduzir os fiéis e, por isso sempre cautelosa, vigia qual pastora do rebanho
do Mestre; de outro, os teólogos querendo trazer à luz, um novo modo de viver e
pensar a fé em consonância com a realidade. Em muitos casos, sob a ideia de
cautela, a Igreja deixou na penumbra sua missão de ser sinal e instrumento do
Reino de Deus. Os teólogos então, com maestria e sensibilidade buscam acender
luzes. A reação por parte da hierarquia Romana, por vezes, foi severa.
Alguns conflitos: em 2007 tivemos
a teóloga Elizabeth Johnson com a obra Em
busca do Deus vivo. Esta obra foi levada por alguns bispos, à Comissão para
a Doutrina da Fé da Conferência dos Bispos dos EUA. Em março de 2011, a
Comissão emitiu uma nota em que se afirma que o livro de Johnson está cheio de
"distorções, ambiguidades e erros”. Em 2010, a mesma Comissão criticou o
trabalho de dois teólogos norte-americanos, Todd A. Salzman e Michael Lawler,
pelo livro A pessoa sexual. Roger
Haight, com a obra Jesus, Símbolo de Deus,
também recebeu a mesma reprimenda que o proibiu de ensinar e publicar obras
teológicas. Em fevereiro de 2011, um grupo de mais de 270 teólogos alemães
publicou um memorando intitulado Igreja 2011: Um reinício necessário afirmando
que a Igreja tem uma desesperada necessidade de "reformas profundas e
radicais" e convocam a Igreja institucional a desenvolver "a coragem
da autocrítica". (ROSS; WILFRED, 2012).
Na Espanha, José Antonio Pagola,
com a obra Jesus. Aproximação histórica, também sofreu a severidade da Cúria
Romana. Recordamos ainda, de Ivone Gebara, silenciada em 1995, do jesuíta Jon
Sobrino, sentenciado em 2007, de Tissa Balasuriya, Hans Küng, Charles Curran,
Roger Haight, Edward Schillebeeckx, Juan José Tamayo, Tony Flannery, Sean
Fagan, Owen O’Sullivan Gerry Moloney entre outros (ROSS; WILFRED, 2012).
Temos também o caso de Andres
Torres Queiruga (BEDOYA, 2012). Trata-se de uma notificação de 20 páginas, publicada
no dia 03 de março desde 2012, em que a Comissão para a Doutrina da Fé da
Conferência Episcopal Espanhola afirma que o teólogo apresenta sete erros doutrinais
e por isso lhe tira o direito de ensinar teologia (GONZÁLEZ; RICO, 2012). Ele
manifestou-se triste e não atendido no seu pedido de diálogo (STRAZZARI, 2012).
O segundo diz respeito à teóloga Ir. Margaret Farley. A Congregação para a
Doutrina da Fé condenou sua obra Apenas
amor: Um marco para a ética sexual cristã, afirmando que o livro "não
pode ser usado como uma expressão válida da doutrina católica" (LEVADA;
LADARIA, 2012) porque discorda do magistério hierárquico em assuntos como
masturbação, atos homossexuais, uniões homossexuais, indissolubilidade do
casamento, divórcio e segundo casamento (FILTEAU, 2012).
Os
conflitos parecem se encaminhar de um modo diferente com o Papa Francisco a frente
da Igreja. De fato, a verdade que se almeja não pode vir do autoritarismo, mas
da reflexão dialogada. O saber da fé precisa ser um saber que brota do brusco
da vida e não de uma ditadura à margem. Também é necessário saber que a Igreja precisa
cuidar do tesouro evangélico e não pode aplaudir toda reflexão. Parece-nos,
pois, que aceitação ou retaliação encontra seus maiores obstáculos na questão
do método como são aplicadas. Francisco nos aponta para o diálogo, meio em que
realmente a teologia.
CONCLUSÃO
Não se reconhece a
força, a veracidade e a importância de algo apenas pelo fato de se mostrar
relevante em algum momento da história. O cristianismo, por exemplo, foi
encarado no início de sua história como mais uma doutrina ou mais um movimento
com data marcada para morrer. Mas não aconteceu assim. Isto porque tinha algo a
dizer às pessoas e era verdadeiro o que propunha. Sua força não estava nas
armas, no poder imperial, nas revoluções violentas, em uma tradição, mas um
caminho de vida, de liberdade, de respostas às questões que incomodavam no
fundo da existência da humanidade. Assim, passou-se o tempo, morreram os reis,
os perseguidores, os sistemas, até mesmo os Apóstolos e o cristianismo continuo
vivo e sempre crescente. “O que tem de ser, tem força”, afirmamos na introdução
deste trabalho, o que dissera o poeta.
Mais de quarenta anos se passaram
desde o início da Teologia da Libertação. Muita coisa aconteceu. A América
Latina e o Caribe não são os mesmos de trinta anos atrás. A Igreja caminhou
enquanto o mundo pisou no acelerador. Tivemos a ascendência da esquerda no
governo de muitos de nossos países. Muitas leis foram promulgadas em benefícios
dos indígenas, negros, desempregados, das mulheres, das crianças, dos jovens.
Vimos religiosos e leigos serem assassinados por causa do Evangelho Libertador,
vimos propostas que não deram certo, gente que mudou de lado quando
assumiu o poder e tivemos até a mudança de Papa. No meio de tudo isto, continua
vigorosos a Teologia da Libertação. É fato de que ainda não é bem aceita no
meio romano, que muitos teólogos não souberam trilhar o caminho que esta
teologia propunha, que alguns até pregaram sua morte. Apenas especulação. A
Teologia da Libertação fez a Igreja latino-americana se destacar no mundo como
Igreja dos pobres e com os pobres. Fez a Igreja toda pensar. Pensar através dos
mais pequeninos. Pensar com o coração e a inteligência de Cristo
Mas não é vocação da Teologia da
Libertação aquietar-se. Se conquistou muita coisa na Igreja e na sociedade, há
um tanto ainda para ser discutido com seriedade. Os desafios da realidade atual
são muitos. Nossa realidade está sendo descristianizada, nossos pobres sofrem
outros tipos de abandono, como tanto recordo o Papa Francisco. É preciso pensar
e propor mais para a vivência fiel da fé. É preciso libertar.
Entre
tudo isto, olhamos para a Teologia da Libertação como um sinal de esperança.
Cremos que ela é dom do Espírito Santo dado a Igreja e por isso buscamos
compreendê-la. Estudar sobre este tema gigantesco, encanta, inquieta, desafia.
Acima de tudo, convoca a uma atitude: ser protagonista nesta história.
Quiséramos poder ter a mesma fidelidade, coragem, dinamismo e ousadia dos
precursores deste modo de fazer teologia. Oxalá pudéssemos dar o passo decisivo
neste campo: passar do discurso para a prática; à luz da fé, pensar Deus e a
realidade povo sofredor, refletir Deus nesta realidade e falar de Deus, apenas
depois de o tê-lo ouvido na voz de quem nunca pode falar!
REFERÊNCIAS
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[1] “O que tomou a palavra é o
sofrimento originado por uma pobreza em massa, cruel, injusta, estrutural e
duradoura no Terceiro mundo. E dessa pobreza se diz, além disso, que irrompeu,
quer dizer, que não se chegou a ter notícia dela ou a declará-la como o fato
maior por pura reflexão ou análise, mas porque ela mesma tomou a palavra em
forma de clamor inocultável, “claro, crescente, impetuoso e, em alguns casos,
ameaçador”, como diz Puebla (n.89). O fato maior tem, portanto, um conteúdo
objetivo: a pobreza; mas esse conteúdo, porque irrompeu, corresponde hoje
inevitavelmente ao sujeito e não permite que ele seja mero espectador. Para a
teologia da libertação isto significa que confrontar-se com a realidade é
confrontar-se com essa pobreza e que esse confrontamento não é optativo e sim
inevitável” (SOBRINO, 1994, p. 49).
[2]
Cf. GALILEA, 1978, p.17.
[3]
Há uma reflexão feita por Benjamim Forcano, sobre o surgimento da Teologia da
Libertação, que nos faz refletir. Diz ele: “a Teologia da Libertação (TdL) não
começou nos anos 70. Em 1492 acontece o chamado ‘descobrimento' da América
Latina; e, em 1511, um frei dominicano, Antônio de Montesinos, em nome de sua
comunidade e ante as autoridades da Isla La Española (hoje República
Dominicana), disse, com referência aos indígenas e ao tratamento que estes
recebiam: "Por acaso, não são homens?. Foi a primeira pergunta de uma
história de libertação, como muito bem explicou o professor Reyes Mate, em
conferência sobre esse tema. Podemos, então, dizer que a história da TdL
começou há 500 anos, em 11 de dezembro de 1511. (FORCANO, 2012).
[4] “Libertação exprime, em primeiro lugar, as aspirações
das classes sociais e dos povos oprimidos, e sublinha o aspecto conflituoso do
processo econômico, social e político que os opõe às classes opressoras e aos
povos opulentos” (GUTIÉRREZ, 1979, p. 44).
[5]
“A busca da libertação do subcontinente
vai mais longe que a superação da dependência econômica, social e política.
Consiste, mais profundamente, em ver o devir da humanidade como um processo de
emancipação do homem ao longo da história, orientado para uma sociedade
qualitativamente diferente, na qual se sinta o homem livre de toda servidão,
seja o artífice de seu próprio destino” (GUTIÉRREZ, 1979, p. 87).
[6]
Medelín constitui o foi o verdadeiro "divisor de águas" na história
da igreja do Continente, de tal modo que se pode falar do "antes de
Medellín" e do "depois do Medellín" (BOFF, 1998, p. 570).
[7]
“As Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) (...) são fruto da "opção pelos
pobres" feita pela Igreja do Continente e a instância operativa da
Teologia da Libertação. As CEBs nasceram logo nos inícios dos anos 60,
portanto, antes de Medellín, mas essa Assembléia as legitimou e generalizou.
Para Medellín, a "Comunidade de base" é uma "comunidade local ou
ambiental, que corresponde à realidade de um grupo homogêneo e que tenha uma
dimensão tal que permita o trato pessoal fraterno entre seus membros"(n.
10). Trata-se do "primeiro e fundamental núcleo eclesial",
"célula de estruturação eclesial e foco de evangelização" e
"fator primordial de promoção humana e desenvolvimento" (n. 10). A
partir das "Comunidades Cristãs de Base" (é assim que então vêm
chamadas), redefine a paróquia, que passa a ser "um conjunto pastoral unificador
das Comunidades de base" (n. 13).” (BOFF, 1998, p. 575).
[8]
“Podemos afirmar seguramente que a ídéia de teologia da libertação adquirem
estatuto eclesial na Conferência de Medellin.” (GALILEA, 1978, p. 22).
[9]
“As ditaduras, que surgiram no Continente a partir dos meados dos anos 60 e de
que os grupos dominantes lançaram mão para sustar o ascendente movimento
popular, foram um elemento precipitador no sentido de as igrejas de cada país
buscarem seu próprio caminho. De fato, quase todos os países da América Latina,
nas décadas de 60 e 70, caíram sob regimes militares violentos: o Brasil em
1964, a Argentina em 1966, a Bolívia em 1971, o Uruguai e o Chile em 1973, o
Peru em 1975, o Equador, em 1976 e assim por diante. E não falemos ainda das
ditaduras, então já "crônicas", como as de Strossner, no Paraguai, de
Duvalier no Haiti, de Somoza em Nicarágua, de Duvalier em Santo Domingo, e das
poucas e fracas democracias, como as da Colômbia e da Venezuela” (BOFF, 1998, p. 569).
[10]
Nenhum tema é apenas o que aparece na forma linguística que o expressa. Há
sempre algo mais oculto, mais profundo, cuja explicação se faz indispensável à
sua compreensão geral. Desta forma, escrever sobre um tema implica em buscar,
tanto quanto possível, romper as aparências enganosas que podem conduzir-nos a
uma distorcida visão de si mesmo. Isto significa que temos de realizar o
esforço difícil de desembaraçá-lo destas aparências para apanhá-lo como
fenômeno dando-se numa realidade concreta” (FREIRE, 1981, p.96).
[11]
Sartre expressou algo similar ao dizer: "Estou condenado, a existir para
sempre para além da minha essência, para além dos móbiles e dos motivos do meu
ato: eu estou condenado a ser livre" (SARTRE, 1998, p.595).
[12] Que basicamente se evidenciam, com mais ênfase, em dois pólos divergentes: o determinismo e o livre-arbítrio. (Cf. DIAS, 2004, p.91)
“O determinismo é a opinião de que todos os acontecimentos são causados (...) o
acontecimento está de tal modo ligado a outro fato precedente, que, a menos que
essa tivesse ocorrido, aquele também não teria acontecido.” (BLANSHARD, 1964,
p.19) “Por
livre-arbítrio se entende normalmente a capacidade do indivíduo deliberar
livremente. Deliberar livremente foi uma condição já apontada por Aristóteles,
denominada por ‘agir voluntário’.” (NAPOLI, 2009, p.73-88). “A noção de livre-arbítrio é baseada na autonomia da
vontade como faculdade da alma, que é livre para assentir em uma coisa, ou um
desejo, entre vários. (REZENDE, 2006,
p.20).
[13]
“A liberdade está ligada ao seu oposto, aos mais variados tipos de escravidão e
servidão.” (DIAS, 2004, p.9).
[14]
Do pecado, principalmente, pois para os cristãos, essa libertação só poderia
ser concedida por Deus.
[15]
Cf. Hebreus 9, 11-14, Romanos 6, 6-11 e João 8, 32 (BÍBLIA SAGRADA Edição
Pastoral, 1991).
[16]
“Libertação é libertação do oprimido. Por isso a Teologia da Libertação deve
começar por se debruçar sobre as condições reais em que se encontra o oprimido,
de qualquer ordem ele seja” (BOFF, C. BOFF, L. 2001, p. 45).
[17] “(...) a partir do lugar
“teológico dos pobres”, se entende melhor quem é Cristo. O filho de Deus não só
deu preferência aos mais necessitados de cura, da dignidade e de justiça, mas
identificou-se com os pequeninos, de Belém á Cruz, e até o dia do juízo final,
conforme Mt 25. (...) A partir do ‘lugar teológico dos pobres’ se entende
melhor quem é o ser humano. (...) A partir do ‘lugar teológico dos pobres’ se
entende melhor a essência e a identidade da Igreja servidora... A partir do
‘lugar teológico dos pobres’ se entende melhor que é Deus, seu modo de atuar,
de ser, e inclusive seus sentimentos e prioridades” (SUSIN, 2007, p. 328-329).
[18]
Antes de existir como teoria teológica, a libertação foi uma prática pastoral e
social. A Pastoral social dos inícios dos anos 60, testemunhada pelos Bispos
proféticos da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), pelos Leigos
comprometidos da Ação Católica Brasileira (ACB) e pelas Comunidades Eclesiais
de Base (CEBs), foram, por assim dizer, a "teologia da libertação em ato
I" (BOFF, 1998, p. 573).
[19]
BOFF, Clodovis. Teologia
e prática. Teologia do político e suas mediações. Petrópolis: Vozes,
1978.
[20]
Denominação mais simples e de cunho pastoral.
[21]
Cf. BOFF, Clodovis. Teologia
e prática. Teologia do político e suas mediações. Petrópolis: Vozes,
1978.
[22]
É neste sentido que afirma o Documento de Puebla (nº 1142) “A nossa Igreja deve
ser a Igreja dos pobres”.
[23]
"Assim como Cristo consumou a obra da redenção na pobreza e na
perseguição, assim a Igreja é chamada a seguir o mesmo caminho... Cristo
Jesus... ‘despojou-se a si mesmo, tomando a condição de servo’ e por nossa
causa ‘fez-se pobre embora fosse rico’, da mesma maneira a Igreja... não foi
instituída para buscar a glória terrestre, mas para proclamar, também com seu
próprio exemplo, a humildade e a abnegação.
Cristo foi
enviado pelo Pai para ‘evangelizar os pobres, sanar os contritos de coração’, ‘procurar
e salvar o que tinha perecido’, semelhantemente a Igreja cerca de amor todos os
afligidos pela fraqueza humana, reconhece mesmo nos pobres e sofredores a
imagem de seu Fundador, pobre e sofredor. Faz o possível para imitar-lhes a
pobreza e neles procura servir a Cristo" (LG, 8).
[24]
A Teologia da Libertação tem sua experiência espiritual fundante no pobre
(LIBÂNIO, 1887, p. 103).
[25]
“A atividade pública de Jesus centrou-se no anúncio do Reino de Deus (...). Mas
como Jesus entendesse que o Reino era de preferência para os pobres, sua
prática entrou objetivamente em conflito com as autoridades de seu povo,
autoridades cujo poder repousava sobre uma lei religiosa (...) Não era intenção
dele tomar o poder, mas usar a força dos fracos para desmascarar a falsidade da
legitimação religiosa para o poder do templo e dos fariseus (...). Jesus
reconhecia que somente a força de Deus dava sentido a uma política que partisse
dos pobres e dos fracos” (PIXLEY, BOFF, 1986 p.37-169).
[26]
Em Tiago 2, 5-7, lemos: “Ouçam,
meus queridos irmãos: não foi Deus quem escolheu os que são pobres
aos olhos do mundo,
para torná-los ricos na
fé e herdeiros do
Reino que
ele prometeu àqueles que o amam? E, no entanto, vocês desprezaram o pobre! Ora, não são os
ricos que oprimem a vocês e
os arrastam perante os
tribunais? Não são
eles que difamam o nome sublime que foi invocado sobre vocês?”
[27]
Jon Sobrino faz uma afirmação radical. Diz ele: “Fora dos pobres não há
Salvação!”
[28] “Neste
contexto, uma Igreja pobre, que faz a opção pelos pobres “denuncia a carência
injusta dos bens deste mundo e o pecado que a engendra; prega e vive a pobreza
espiritual como atitude de infância espiritual e abertura para o Senhor;
compromete-se ela mesma com a pobreza material” (DM, Pobreza da Igreja, 5). Por
isso que “a pobreza da Igreja e de seus membros na América Latina deve ser
sinal e compromisso: sinal do valor inestimável do pobre aos olhos de Deus;
compromisso de solidariedade com os que sofrem” (DM, Pobreza da Igreja, 7).”
In: RASCHIETTI, 2008, p. 17.
[29]
A instituição do Diaconato, por exemplo (At, 6, 1-6).
[30]
“A Macedônia e Acaia resolveram fazer
uma coleta em favor
dos cristãos pobres da
comunidade de Jerusalém. Resolveram fazer isso, porque são devedores a
eles. De fato, se os pagãos participaram nos bens espirituais dos judeus,
eles têm obrigação de
ajudá-los em suas necessidades materiais” (Rm 15, 26-27).
[31]
Itálico nosso. O órfão e a viúva são sinônimos do pobre mais pobre, sem
direitos e amparos da sociedade.
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