A lágrima que banha nossa face

Por que choramos? E, por que, quando a gente chora, as lágrimas banham nosso rosto? Eu pensei muitas vezes sobre isso. Muitas vezes eu precisei falar sobre isso. Em outras tantas foi o meu silêncio que apenas acolheu elas, as lágrimas, como visitantes não esperadas, mas tão presentes.
Fisiologicamente se encontra uma explicação com rapidez. É uma produção em excesso de lágrimas, estimulada por uma grande emoção, e que o canal que as leva para a garganta não comporta. Pode ser entendida ainda como uma expressão mímica para comunicar dor, nascida antes da linguagem falada[1]. Tudo bem. É assim mesmo. Mas não é só isso. Porque o que vivemos no nosso organismo possui uma centelha de divino. E é essa centelha da vida humana que nós mais enxergamos nas lágrimas.
A gente chora porque a alma ferida pela dor ou pela alegria quer falar e não pode. Não pode porque está tão ferida que já não tem forças para gritar e comunicar toda angústia que sente; não pode porque as palavras não conseguem traduzir o que sente. Na alegria suprema, a lágrima banha a face porque o contentamento é tão grande que parece transbordar na gente. No sofrimento elas vêm como que um modo de escoar a dor, de lançá-la para fora, é o sumo amargo da tristeza que a alma sofrida derrama quando é açoitada.
As lágrimas podem também ser vistas como metáfora da pessoa que, sempre forte, sempre sólida, diante de grande emoção na alegria ou dor, se liquefaz, desmancha-se, e verte-se para fora de si mesma. É um pedido de ajuda, é uma demonstração de fragilidade, é um desmanchar-se para remodelar-se, para a pessoa ser formada de novo; também socorrida ou acolhida sem muita exigência, já que liquificada amolda-se ao coração que a acolher.
O choro pode expressar, ainda, um purificar-se. Como a água que lava a face da terra, a lágrima lava a face da alma e as profundezas do coração. Assim, muitas vezes precisamos do choro, das lágrimas. Para que elas lavem nossa alma. Lavem do mal (choro do arrependimento), lavem do ódio, da raiva, do rancor (choro do perdão), lavem do medo, da incerteza, do desprezo (choro da superação), lavem da tristeza, das decepções, dos insucessos (choro de alegria), lavem da onipotência e do egoísmo (choro da despedida).

         E poderia seguir falando (até acho que falarei mais, porque este texto ainda está em construção). Mas o que queria dizer é que podemos acolher toda lágrima que verte em nossos olhos e banha nossa face na presença de Deus. Quem chora com Deus faz das suas lágrimas uma oportunidade de rezar e de iluminar sua alma. Chorar com Deus é fazer das lágrimas um meio fecundo de regar o solo da vida para que ela produza sempre bons frutos. Chorar com Deus significa procurar ombros de pessoas boas, significa aprender com a dor, ou aprender com a alegria. Chorar com Deus significa sentir a dor do outro, compaixão. Chorar com Deus é acreditar que, apesar de tudo, a vida tem seu amanhã. E que o amanhã será um bom presente pra gente.




[1] Cf. Juan Murube Del Castillo, da Universidade de Alcalá, em Madri.

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