O Sacramento da Penitência e o ato da Confissão

1)
A
confissão faz parte do Sacramento da Penitência,
mas não é todo ele. O Sacramento da Penitência envolve: preparação, oração, exame de consciência, arrependimento,
confissão, absolvição e reparação. Enfocamos
muito o fato da confissão, mas na verdade, em cada passo, Cristo está agindo
com sua Misericórdia e Compaixão. Misericórdia significa: ter o coração nas misérias
– imagine uma mãe que corre para tirar o filho do meio de uma poça de lamas.
Ela se suja com a sujeira do filho. A diferença é que a mãe não vai, de forma
alguma, ingerir aquela lama, já a criança pode até se afogar. Com Deus é assim
também. Ele une seu coração à nossas misérias para nos resgatar, mas nunca o
pecado é maior do que seu amor. Compaixão significa: sofrer junto,
(compadecer-se, padecer com). É isto ai: o processo de sofrimento de cada
pessoa em pecado é assumido por Deus. Deus sofre com a gente, mas seu
sofrimento possui dimensão redentora, como um pai que sofre por enviar sua
filhinha sozinha para a escola, mas sabe que ela precisa se desafiar para ser
sempre mais independente. Então ele sofre junto com ela, mesmo fazendo cara de
durão. E até chora escondido... mas não desiste de insistir que ela se desafie.
A catequista deve esclarecer que desde o primeiro encontro de catequese, o Sacramento já começou a se realizar – a preparação. Deve mostrar que no exame de consciência é o Espírito de Deus que vem
iluminar para que reconheçamos nossas faltas e nos tornemos livres pelo arrependimento e
perdão de Deus. Sim, o arrependimento é graça de Deus, a gente sozinho não o
faz, é um imã de Deus, que nos atrai porque nos quer unido a Ele. Arrependimento
neste contexto significa: “eu não quero mais isso para mim, pois isso me
prende. Eu quero possuir a liberdade e a alegria dos filhos de Deus, amar e ser
amado no amor de Deus, no amor humano que Deus propõe e impulsiona.” Depois de
todo esse processo repleto da graça carinhosa e santificante de Deus é que vem
a confissão, que se dá num encontro
pessoal, único, sigiloso e fraterno com o padre. O padre como um pai, como um
irmão, como um anjo de Deus vai ouvir a confissão, aconselhar o caminho certo e
conceder a absolvição, limpar a alma de
toda sujeira, quebrar toda algema, toda prisão, aliviar o fardo, vestir a
pessoa com a graça de Deus. Depois vai sugerir um ato
reparador. Quando a gente estraga alguma coisa, é justo e certo que
concertemos, quando podemos. Se esquecemos de dar água à uma planta que está
dentro de nossa casa, quando lembramos ou alguém nos chama a atenção, a
primeira coisa que fazemos é ir dar água a ela. O perdão de Deus exige ação: que
concertemos o quebrado, lembremos o esquecido, cuidemos do debilitado, honremos
o compromisso assumido e voltemos à luz. Tudo isso tem que ser acompanhado de oração, que é o diálogo com Deus. Tudo isso é por
si só, oração, mas um bom ato de contrição, o pedido da intercessão dos santos,
dos anjos e da Virgem Maria, ajuda. Então, que se reze com palavras próprias,
com palavras da Igreja, da bíblia, que sempre se reze. Esse sacramento chama-se
Penitência porque exige humildade,
pequenez da alma e certo “sofrimento”. Quem ama sofre ao perceber que machucou
a pessoa amada. Quem quer bem, sofre com o distanciamento, “pena” por não
conseguir ver o rosto da pessoa amada. Se não houver esse aspecto para a
confissão, ela não se dá em sua plenitude. Entendem então, o que quero dizer? O
cansaço vale a pena, só se levou para o lugar onde se queria ir. É uma penitência
caminhar, mas é uma graça se a caminhada árdua leva aos braços da pessoa amada.
2)
O
medo.
Esta característica presente nos adolescentes e que vem do ato da Confissão, no
meu modo de entender, surge da interpretação errada que formamos da realização desse
sacramento. Para que ele de fato seja um momento de graça na vida de qualquer
pessoa, é necessária a convicção do ato
Misericordioso de Deus. Nem sempre
nos damos conta de que isto, para muitos, não é evidente. Deus ama a cada um em
especial, conhece o íntimo e deseja que tudo em nós seja santificado, iluminado
por sua graça, fortalecido por sua presença. É preciso falar disso e mostrar
com nossos gestos de ternura e responsabilidade.
3)
Ato
exigente.
Se Deus nos ama, jamais iria instituir algo ruim e nos submeter a isso. A
Confissão é algo muito bom, mas sabemos que nem tudo o que é bom
necessariamente tem gosto agradável, aparência atrativa, sensação prazerosa.
Basta, por exemplo, lembrar, de alguns remédios, injeções, alimentos não
saborosos e atraentes... se nos basearmos na primeira impressão, nunca
tomaremos tais coisas como boas para nossa vida. A confissão é exigente, não
podemos negar, mas é exigência necessária para a purificação. Uma injeção pode
doer bastante. Só que há casos em que só uma boa injeção ajuda na recuperação
da saúde. A confissão é um momento em que a gente abre a ferida para receber o
remédio, por isso é natural a repulsa. Agora, o resultado também sabemos: a
pessoa se renova, a alma reconquista a paz, a felicidade encontra espaço na
gente, Deus fica contente pela amizade reatada e estreitada, a pessoa retoma
sua liberdade para amar mais e mais.
4)
Concepção
de que pecado é coisa ultrapassada. Há ainda a ideia de que pecado é coisa
do passado, que há erros, mas estes não exigem a conotação do perdão
sacramental, basta superar... Nossas crianças não sabem analisar a veracidade
destas afirmações, apenas tem tais conceitos na mente, fruto da cultura atual e
de uma enxurrada de orientações anticristãs vindas de todas as partes,
inclusive de algumas famílias. Gente, anular a concepção de pecado é uma forma
de anular outros valores da concepção cristã. Há aí uma intenção de formar um
efeito dominó: caindo a concepção de pecado, cai a exigência da caridade,
depois da oração, seguida da de compromisso e assim sucessivamente. Já
percebemos estes sinais na sociedade? Sim ou não? Sim, né! Não quero orientar
que enfoquemos somente o pecado como principal dimensão da penitência, claro
que não! Antes de tudo a Misericórdia de Deus! Mas é certo conscientizar sim:
sobre o pecado, sobre o inimigo que deseja nos afastar de Deus e sobre a
constante vigilância que se deve estar. Pecado não é maior que o amor de Deus,
já disse isso, mas a relatividade nesse assunto diminui o sentido do Sacramento da Penitência, por isso é preciso insistir
no esclarecimento deste aspecto também.
5)
Confronto
com a realidade pessoal e convite à autonomia responsável. Já parou para
pensar que a maioria das crianças, na confissão, pela primeira vez, ficarão
sozinhas com alguém (uma autoridade – o padre) para falar de seus erros? Que
talvez seja a primeira vez que ela se dê conta de que é responsável pelos seus
atos? Que realmente há diferença entre o bem e o mal, o certo e o errado?
Gente, a confissão, no meu modo de entender, marca um dos maiores passos de
amadurecimento de uma criança. É por isso que oriento e insisto na boa
preparação a ela. A criança vai receber Jesus Cristo na Eucaristia sabendo que
Ele a ama a ponto de antes tê-la perdoado. Vai sabendo a diferença entre Ele e
ela. Vai sabendo que é responsável por guardar o corpo do Senhor dentro de si e
dentro dos outros. Então a confissão como que “sela” a autonomia iniciante na
adolescência. É um passo privilegiado para o crescimento pessoal. Isso se os
prepararmos bem para ela e a experiência for como é para ser.
6)
A
punição.
A educação em casa geralmente se dá por punição e recompensa. Mas, esta não é a
lógica de Cristo. As crianças geralmente não separam isso. “Se eu contar para o
padre, o que ele vai fazer?” Esse aspecto tem que ser trabalhado com paciência
e insistência. Deus sempre educa, mas nunca castiga, mostra o caminho novo,
nunca amarra a pessoa, abraça, jamais esbofeteia. Da mesma forma agem aqueles
que são discípulos-missionários Dele. A parábola do filho pródigo é bem
propícia, pois ajuda a entender o que é o perdão que Deus concede e a passagem
da mulher adúltera que seria apedrejada, dá o toque da confiança de Deus.
7)
Confiança
de Deus.
Eis outra ênfase necessária por parte das catequistas: Deus, com o perdão,
expressa sua confiança na criança, na pessoa que se arrependeu. É como se Ele
considerasse a gente como uma fonte sempre capaz de jorrar bem mais a água
cristalina do amor, da alegria, do bem. Mesmo que algumas vezes jorremos água
enlameada, Deus que conhece o nosso coração sabe que somos bons e confia de
novo a graça de jorrar o bem e para o bem. Porque ama, perdoa. Perdoa porque
confia e confiando, cura. O Sacramento da Penitência
também cura, não podemos esquecer disso. Deus não só perdoa, mas socorre com a
graça da cura seus filhos amados, tira os canais de lama que sujam a fonte.
Essa cura não é de uma hora para outra, embora para Deus nada seja impossível.
Geralmente ela se dá pela conversão da pessoa, que é o primeiro e grande sinal
da cura divina. Mas há doenças que o perdão cura, que a graça do sacramento
concede, mais ou menos como a cura dos leprosos a quem Jesus pediu para irem
caminhando até o sacerdote e no caminho eles foram percebendo que as feridas
iam desaparecendo e a pele ia sendo rejuvenescida. O Sacramento da Penitência
cura, porque combate e vence a infecção do mal e implanta o sopro do Espírito
Santo.
8)
A
penitência que o padre vai dar. Mais um grande medo dos catequizandos
que remonta ao apresentado no ponto seis dessa reflexão. A penitência ou
orientação do padre depois da confissão dos pecados é encarada como “punição”
pelo pecado cometido. Mas não é isso, trata-se do ato reparador que mencionamos
no ponto primeiro. Então, precisamos falar com eles sobre o que é “a penitência
que o padre dá”. Pode ser uma oração, para expressar o diálogo reatado com
Deus, uma ação para restabelecer a amizade com o próximo, um ato de caridade
para vincular-se ao amor de Deus que é mais ação do que palavras ou idéias. Não
é uma imposição arbitrária, mas um convite à união de coração e de ação com
Deus.
9)
O
feio que precisa ser mostrado. Gostamos de falar das coisas boas que
acontecem em nossa vida, não é? Sim gostamos! Pois é, mas agora, na confissão,
é hora de mostrar que na vida não há só luz. Há partes que são trevas. No mundo
dos holofotes privilegia-se o que reluz e esconde-se o obscuro – “tudo o que é
bonito é para se mostrar” e o que é feio se disfarça. Na confissão nada se
disfarça, mas se encara de frente, com coragem, simplicidade e confiança. A
criança precisa criar consciência que para Deus tudo tem valor e não só o que é
bonito, como constantemente ela percebe. Ele, claro, quer que tudo brilhe e que
todos conheçam cada dia mais o perfeito que há na gente, mas Ele se preocupa conosco,
a ponto de nos chamar em segredo, através de um ministro seu, afim de que nós
lhe mostremos nossa vida e que ele traga a luz para que esse lugar da vida seja
iluminado. Você sabe que nada pode ser aceso com chamas naturais onde não há
oxigênio, pois o fogo se dá justamente na queima de oxigênio. Deus, com o
perdão que só o padre pode conceder, quebra as paredes que privam o oxigênio de
entrar e então sua graça pode ser acesa em nós novamente. É preciso sim, mostrar
o que não é bonito, para que Deus o transforme. Lembre-se que as flores mais
belas e perfumadas nascem em meio ao esterco. O Sacramento
da Penitência quer ensinar isso também.
10)
A
ideia de que Deus perdoa sem necessidade da confissão sacramental. Dizem muitas
pessoas para nossos catequizandos: “Deus nos perdoa sem precisar da confissão
ao padre. Ele sabe do que fazemos e sua misericórdia não tem limites”. A Igreja
sabe que a dimensão do perdão divino é ilimitada, mas foi Cristo que pediu que
a gente fizesse assim. Não basta pedir perdão a Deus, isso cheira a egoísmo. É
preciso pedir perdão à comunidade que sofre com nosso pecado também. Mas você
não vai falar a todo mundo de seus pecados, então o padre que é o principal
responsável pela comunidade te ouve e te perdoa, também em nome dela. No
princípio da Igreja, todos se reuniam e confessavam seus pecados
comunitariamente, pedindo perdão e perdoando, com a presença do presbítero que
oferecia sacramentalmente o perdão. Com o tempo isso deixou de ser viável e
então as confissões passaram a ser mais pessoais, embora essa prática também já
existisse. A confissão pessoal estimula a sinceridade para com Deus em todos os
âmbitos da vida, inclusive aqueles morais muito particulares ou então de
dúvidas em que a gente cometeria um mal maior se partilhasse com todos e
alimentaria esse mal se não partilhasse com ninguém.
11)
A
desculpa dos pecados do padre. Ah... mas, o padre também é pecador!
Sim, ele é! Mas Cristo que age através dele, não. O padre Zezinho faz a
seguinte comparação: se você está dirigindo numa avenida movimentada e chega
próximo a um farol que está suspendido por um poste de madeira que se encontra
podre. Só pelo fato de o poste estar podre você vai deixar de seguir a
orientação do semáforo? Não, né? Porque as consequências podem ser muito ruins
e, uma coisa é o semáforo, outra o poste que o sustenta. Claro que seria melhor
que os dois estivessem em boas condições, mas o poste não anula o sinal do
semáforo, nem a importância do que sinaliza. Do mesmo modo, os pecados do padre
não anulam a graça de perdoar que ele recebeu de Deus, por meio da Igreja. Quem
perdoa é Deus, o padre é instrumento do perdão de Deus, não é a fonte, mas o
canal por onde a doce e refrescante água chega à casa interior de cada pessoa e
de toda comunidade.
12)
O perdão não é mais considerado como um valor e muito
menos o ato de pedir perdão. Essa é uma verdade dolorida e muito
presente na sociedade. O perdão tem sido mostrado como sinônimo de fraqueza e não
como valor. Pedir perdão, para a ideologia capitalista vigente é acovardar-se,
é ser bobo, mostrar-se inferior. O perdão passa a ser visto como um modo
político de manter relações que convenha à pessoa, mas não como um ato divino
humanamente assumido. “Posso até perdoar, mas você tem que me dar algo em
troca”, dizem muitos, e a lição do amor-gratuidade se ignora. Quantos, ao
assistirem nos filmes Cristo sendo julgado e condenado, desejariam que Ele
acabasse com todos, mais ou menos como fez as autoridades dos EUA na execução
de Osama Bin Laden. O Papa João Paulo II, por exemplo, pediu às nações ricas que
perdoassem as dívidas dos países pobres, mas muitos diziam que isto não era
viável, nem possível, mesmo aplaudindo o Santo Padre quando perdoou Ali Agca, o
homem que atirou nele e quando pediu perdão pelos erros da Igreja. Elogiaram,
mas não quiseram ouvir o velhinho no desafio a uma convivência fraterna, que necessariamente
exige perdão. Então, pessoal, precisamos mais do que nunca, mostrar o valor do
perdão – o perdão de Deus, o perdão entre as pessoas. Jesus mostrou que perdoar
e pedir perdão, é estar disposto a mudar, a crescer, a humanizar-se e tornar-se
semelhante ao Pai Eterno. Mais famílias permanecerão unidas, mais amizades resistirão,
mais comunidades se fortalecerão se cultivarmos o perdão. É grande aquele que
perdoa, tem controle de suas emoções, de seus sentimentos, tem visão dos fatos
que vai além dos erros. Nada o faz parar, pois sua meta é o amor. Ama sem
limites e vence os espinhos. Pede perdão, perdoa e vive, vive livre e feliz. O
perdão de Deus é a coisa mais importante perante o pecado e Ele passa pelo
perdão a si mesmo, aos outros e pelo Sacramento da Penitência – é isso que
ensina a Igreja. Tem valor primordial o perdão na nossa fé. Com ele somos
melhores. Ele nos faz filhos de Deus e não senhores do Senhor, nos leva aos
braços do Pai e nos tira do chiqueiro ocupado pelo rancor, pelo ódio, pelo
ressentimento, pelo sentimento de vingança, e tudo mais que nos impede de
sorrir, viver e trabalhar pelo bem.
Bom,
gente, esse texto surgiu da minha reflexão como catequista e orientador nesta
paróquia. Não é algo terminado, nem exatamente certo, mas cheio da vontade de
vos ajudar. Espero que ele possa contribuir em vossa vida e missão. Desejo que
o Sacramento da Penitência seja realmente um momento de conversão, santificação
e renovação na caminhada de fidelidade ao Bom Deus. Que Ele vos abençoe. Amém!
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