Cristo, os pássaros, o Papa


O homem que observa a natureza sempre encontra algo de si nela. Eu, particularmente, busco ler nas entrelinhas da Criação as lições de sabedoria que o Criador deixou tão evidente. Uma das cenas mais bonitas que já vi foi o voo de pássaros em bando. Você também já deve ter visto. Eles formam no céu, geralmente, a forma “V”. V de vida, V de verdade. E este voo tem uma bonita sincronia. De quando em quando os pássaros vão alternando a posição. A forma V serve para que eles cortem a resistência do ar e o voo seja facilitado para todos. Aquele que vai à frente permanece um bom tempo bifurcando o ar. Quando cansa, troca de lugar com outro que já descansou, indo para uma posição anterior, mas igualmente importante para o grupo.

Além de ter em mente esta imagem do voo dos pássaros, passei o dia pensando nestas palavras de Jesus: Os mestres da Lei e os fariseus gostam de ser cumprimentados nas praças públicas e de serem chamados de Mestre. Quanto a vós, nunca vos deixeis chamar de Mestre, pois um só é vosso Mestre e todos vós sois irmãos. Na terra, não chameis a ninguém de pai, pois um só é vosso Pai, aquele que está nos céus. Não deixeis que vos chamem de guias, pois um só é vosso Guia, Cristo. Pelo contrário, o maior dentre vós deve ser aquele que vos serve. Quem se exaltar será humilhado, e quem se humilhar será exaltado (Mateus 23,1-12). Encontrei uma ligação muito singular entre estas cenas. Nós, assim como os pássaros, precisamos de lideranças, de pais, de mestres, de guias, bem como, em algum momento da vida, assumimos estes papeis. No entanto, Jesus faz uma advertência dizendo que não deveríamos chamar ninguém assim. Por quê? É errado? Não, amigos! Não é! O Senhor estava falando de outra coisa. Falava de funções sociais estéreis, de títulos cobrados, mas não assumidos como vocação. Referia-se a mestres, pais, guias, lideranças de seu tempo que não queriam servir e promover o bem de todos. Por isso pediu que tais honrarias fossem purificadas.

Meus caros, penso que no percurso para a verdadeira vida a analogia do voo é muito adequada. Vejo também, que as palavras de Cristo se encaixam nesta comparação. Como os pássaros, estamos sempre partindo. Mesmo que queiramos, não vamos sós. Vamos em comunidade. Destarte, precisamos alternar, de quando em quando, a posição do voo. Muitas vezes é preciso estar à frente, ser mestre e ser guia. Tudo bem! Mas, assumamos este lugar por causa do grupo e não por causa de si mesmo, permanecendo até aguentarmos, sem permitir que ninguém se acomode ou se aproveite em demasia. Alternemos quando outro for capaz de assumir a mesma posição. Isto é sinal de sabedoria. Estejamos a serviço quando o serviço for bom para o bando. Não importa quem está à frente quando chegarmos. O importante é chegarmos. Provavelmente o último a chegar será aquele que passou a vez para ao primeiro, por isso os últimos serão os primeiros e os primeiros serão os últimos. O segredo da maestria, da liderança está no servir. O primeiro lugar assumido na necessidade e por vocação é desejável por causa da comunidade, mas o último também. Quem voa com Cristo logo descobre que estar à frente exige muito e não tem sentido se não tiver aqueles que o assumirão quando nos cansarmos.

Voando em meus pensamentos encontro a figura do nosso Papa. Ele está nos dando um belo exemplo disso que estou falando. Amanhã será seu último dia à frente da Igreja. Ele cederá o primeiro lugar para outro que vem atrás com mais fôlego, mas não sairá do bando. O papa voou por sete anos à frente da Igreja e entendeu que era preciso alternar. E cedeu. Com sua renúncia, a Igreja não perde um Papa. Ela ganha um exemplo vivo de serviço, fé e desapego. Estamos sendo recordados por ele, com este seu sublime ato: na Igreja poder é serviço e quando não se pode mais servir como convém, se compartilha e, até mesmo, cede o poder, pois o que importa é que Cristo seja anunciado e o povo de Deus, servido.[1] O Papa volta para o último lugar no voo e convoca toda a Igreja a se movimentar em vista do bem comum. Isto é exemplo que arrasta e tem mais força do que palavras que convencem!

Irmãos e irmãs, sirvamo-nos uns aos outros e não nos apeguemos a nenhum poder ou título. Apeguemo-nos a Cristo! Troquemos de lugar com quem está atrás, sem medo de perder. Sim, nada se perde quando se partilha. Nós não somos onipotentes. Vivemos em comunidade justamente para compartilhar de todos os lugares possíveis, afim de que cheguemos à meta de nossa jornada. Quanto aos títulos, nos contentemos em chamar-nos irmãos e irmãs. Era isto que Cristo estava sugerindo. Voemos juntos, sempre servindo, seja no meio, no último ou no primeiro lugar, porque no voo para o céu não se vai sozinho, mas em comunhão. Assim nos ensinam os pássaros. Do mesmo modo, nosso Santo Padre o Papa Bento XVI e, especialmente, Nosso Senhor Jesus Cristo. Amém!



[1] Como expressei no artigo “Renúncia do Papa”.

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