Se importando com a Religião


As instituições religiosas sempre foram o referencial para a maioria dos seres humanos. Com o poder de ecoar o eterno na brevidade da vida e a esperança em dias difíceis, cada religião ou igreja ganhou credibilidade quando soube conjugar a doutrina com a profecia, o louvor com a prece, o sermão com a ação. Entretanto, a história nos mostra que o homem deu lugares distintos à religião em diferentes momentos do seu pensar, sentir e agir. Atualmente vemos um cenário bastante interessante. De um lado a apatia às religiões, de outro um sincronismo com vários sabores que não excluem, inclusive, fanatismo e relativismo.

Quem representa e está inserido numa comunidade de fé e recebeu a missão de orientar as pessoas que professam o mesmo credo, tem diante de si a preocupação em garantir que sua mensagem encontre interlocutores e possa gerar frutos.[1] Assim, faz-se necessário ter um conhecimento, ainda que fragmentado, do contexto religioso. É sobre isto que quero discorrer, valendo-me da obra Feche a Porta dos Fundos [2], de Alan HARRE.

A primeira coisa que ele chama a atenção é que “os ritos de passagem pelas quais as pessoas se tornam membros de comunidades religiosas são bem conhecidos, e os utilizados pelas pessoas que abandonam a congregação permanecem inexplorados” (p. 15). Isto é verdade. Quem de nós conhece o processo de abandono de determinada igreja ou religião e a migração para outra ou não? Muitas vezes prefere-se a estigmatização ou depreciação de tal ato em vez de procurar conhecê-lo e, nele, identificar a profecia que possa estar sendo emitida.

Alan HARRE traz algumas estatísticas muito interessantes quando a permanência e desligamento dos fieis de suas respectivas igrejas. Segundo ele “a probabilidade do desligamento de crianças até 12 ou 13 anos é pequena (2.6 %); a média de abandono alcança seu máximo entre jovens de 13 a 19 e 20 anos [3] (15.1 %); a média cai para 9.11 % para pessoas entre 20 e 25; se ajusta aos 4.6 % na idade de 25 a 54; e então cai para o mesmo nível das crianças, para aqueles que passam dos 55” (p.18). Ele ainda diz que 80 % retornam, um dia, às suas igrejas e que aos 20 anos a média de abandono diminui quase que 50 %.[4]

O autor, se valendo de outros autores e de várias pesquisas, descreve vários motivos pelos quais as pessoas deixaram a vida ativa na Igreja. Elencamos alguns: não se sentiram amadas, aceitas ou desejadas pelos outros membros [5]; também porque as atividade da igreja eram relevantes ou provocavam ansiedade (realidade, neurótica, moral, existencial); quando saíram ou abandonaram ninguém as visitou [6]; a falta de apoio da família ou o cônjuge e, inclusive, a insatisfação no casamento [7]; os relacionamentos destruídos na comunidade bem como ao fato de que muitas pessoas, ao se mudarem, por exemplo, não conseguirem encontrar um grupo da qual consigam fazer parte; fala também do evidente em nossos dias que são os sermões ruins [8], o tédio das liturgias e uma vida comunitária que afasta mais do que a discordância da doutrina; traz uma questão muito peculiar que é a existência de igreja não ativa na área social; e ainda, com grande relevância, as questões de idade avançada, perda do cônjuge, difícil acesso, enfermidades e impessoalidade na comunidade por parte dos membros e pastores [9].

O autor também descreve que o maior motivo que leva uma pessoa a buscar a igreja é o desejo de estabelecer relacionamento com outras pessoas, por isso quem deseja trabalhar para limitar as desistências deve: conservar a participação ativa das pessoas através de cuidadosa incorporação; dar atenção às pessoas que se mudam [10], promover melhores cultos e sermões, ter cuidados pastorais eficientes, investir na educação cristã [11], igualmente em encontro com casais [12], apresentar aos jovens “Cristo, o transformador da cultura”, criar eventos de confraternização, bem como pequenos grupos de oração, procurar solucionar os conflitos e não ignorá-los, administrar os conflitos no contexto das liturgias (ação de graças, confissão, absolvição, intercessão, serviço), encorar/elogiar os voluntários rotineiramente e inserí-los numa ação social [13].

O que fazer com os inativos? Procurar descobrir o motivo, a causa de seu afastamento conversando com eles [14], visitá-los o quando mais rápido possível, criar um grupo de amparo às pessoas inativas e lutar pelo aprimoramento das atividades e formação dos membros da igreja. O autor diz que é preciso ter um sistema que identifique os sinais de inatividade dos membros e um sistema reacionário que não permita o progresso da inatividade. Nada acontece do nada. Há sempre sinais quando alguém está se afastando. A receita é reagir. Quem não reage legitima o status quo e isto é um ataque à própria crença.

No Brasil, segundo os dados do Censo do IBGE de 2010, temos um número decrescente de Católicos Romanos. Somamos 64,6% da população, sendo que os evangélicos somam 22,2%, os espíritas 2%, pertencentes à Umbanda e ao Candomblé 0,3%. Os sem religião já são 8%. Outras religiosidades totalizam 2,7%. Como Católico e Religioso, saio enriquecido com esta leitura. Tais dados e apontamentos me levam a repensar minha Igreja e suas práticas. Preocupa-me a diminuição vertiginosa dos que professam a mesma fé que pratico. Quero poder ajudar minha Igreja. Sendo agente de pastoral com o desejo de auxiliar as comunidades a crescerem dentro da proposta evangélica, apresento aos leitores esta síntese para que possam ajudar nas conclusões quando à vida de fé numa comunidade ou congregação.

A porta dos fundos não precisa continuar sendo uma alternativa. Ninguém precisa "sair de fininho", pois são importantes em nossa vida. Sua ausência não faz bem à comunidade, pois sua presença qualifica nossa jornada rumo ao Reino que cremos. Contando com todas estas realidades que fui elencando, procuremos transformar o ambiente de nossas igrejas e comunidades para que sejam lugares de alegria, força, esperança e fraternidade. Que nos ajudem a humanizarmo-nos através do cultivo da mística e nos possiblitem sacralizar cada momento de nossa vida. Grato por vossa atenção!

 



[1] Duas grandes motivações teológicas por que os líderes estão preocupados com as pessoas que a abandonam. A primeira é a compreensão de que as pessoas são incapazes de edificar a si mesmas. A segunda é que uma pessoa que se retrai não leva a sério a importância de seus dons para o bem-estar da Igreja como um todo (p. 34).
[2] Artigo escrito a partir da leitura de HARRE, Alan F. Feche a Porta dos Fundos. Porto Alegre: Editora Concórdia, 2001.
[3] Entre as diferentes causas de abandonos, encontramos: atritos familiares, a igreja oferece pouca coisa de valor para eles como pessoas, os programas da igreja suprem mais as necessidades das crianças e dos adultos, atitudes e estilos de vida cosmopolitas, ao receber mais educação, se tornam mais volúveis, diversificados nos sistemas de valorização, sermões e ensinamentos fracos, tudo muito tediosos, trabalho sem relevância, currículos irrelevantes, apatia entre membros, apatia do cônjuge e da família com o envolvimento do indivíduo na igreja.
[4] Muitos dos motivos por que as pessoas abandonam a vida da congregação local estão além do controle ou poder da congregação. Isso pode nos trazer um sentimento de frustração. Por outro lado, há outros fatores que podem muito bem ser abordados pela congregação local. Em vez de desesperar com aquilo que não pode ser alcançado, seria prudente concentrar os esforços naquelas áreas onde a congregação é capaz de agir de forma positiva e remediável (p. 16).
[5] Quando as pessoas se unem a uma congregação, elas resistem em mencionar necessidades pessoais ou satisfações sociais como causas de filiação. Elas conscientemente relacionam o ingresso com participação em programas e valores religiosos. Quando saem, no entanto, quase sempre dizem ser por causa da falta de um bom relacionamento (p.26).
[6] Aqueles que abandonam a congregação, consciente ou inconscientemente, dão apenas seis a oito semanas de tempo para a congregação procura-los após sua decisão de abandonara a Igreja (p. 21).
[7] Quando líderes religiosos, jornalistas e teóricos levantam a questão ‘o que fazer para que as pessoas se tornem mais religiosas?’, a melhor resposta Pra Ser oferecida baseada neste estudo é ‘torne os casamentos mais felizes’. (Andrew Greeley in HARRE, p. 22).
[8]  O povo gosta de suas congregações se os sermões são bons Se os sermões fossem dirigidos às pessoas do dia de hoje e dados num estilo compreensível e que valesse a pena serem ouvidos – os bancos da igreja gradativamente ficariam novamente lotados. Os sermões não se tornaram ultrapassados. Simplesmente se tornaram monótonos (Andrew Greeley in HARRE, p. 22).
[9] Um terço ou até mesmo a metade dos membros de todas as Igrejas protestantes sentem que não pertencem ou não encaixam na congregação da qual são membros, nem se sentiam aceitas pelos membros mais antigos da congregação e seus líderes (p. 25).
[10] Quando uma família se muda, os lideres enviam recomendação e indicam onde elas poderão se inserir na nova comunidade.
[11] Experiências religiosas na infância têm menos a ver com programas de congregação do que com a poderosa influência que os pais têm na vida, experiência e treinamento religiosos (p. 44).
[12] A participação nos encontros de casais na igreja havia trazido muitos adultos de volta à Igreja. O impacto experimentado nesse encontro fez com que olhassem mais uma vez, e de maneira mais séria, para a igreja (p. 45).
[13] Mais pessoas saem da igreja porque a igreja não é suficientemente ativa na área social do que a abandonam por ela ser ativa demais em causa social (p.30).
[14] Eles darão desculpas, mas ouvindo ativamente, várias horas (6 a 10), visitando-os (só na quarta visita se entenderá as reais motivações de sua retirada) (p. 65).

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