Das conversas com o Pai

         Era de madrugada. O silêncio na pequena aldeia imperava como rei. O sol ainda não tinha se manifestado. Tempo propício para o amor, tempo certo para a conversa.

         Maria já sabia, que se ouvisse a porta se abrir em plena madrugada, era seu moço crescido, que no segredo da noite, preparava algo que o silêncio do coração dela já estava desconfiando. Ao voltar pela manhã, com os cabelos molhados de orvalho, encontraria Ele, servida a refeição matinal, que as mãos e o coração da mãe haviam preparado. Refeição! Palavra que Ele compreendeu muito bem.

         O que foi fazer lá? “Conversar com o Pai”. Uma simples resposta, sem delongas e explicação, é o que Maria podia responder, dentre seus afazeres do dia.

         Nessas conversas, ninguém sabe ao certo do que falavam, só sabemos no que resultaram. Palavra de pai sempre pesa pra gente. Palavra de filho não alcança outro lugar a não ser o coração. Muitas decisões foram tomadas nessas madrugadas de conversas longas: ir para outros lugares, escolher aqueles que teriam a missão de proclamar as verdades por Ele testemunhadas, seguir o mesmo caminho ou não. Das conversas com o Pai, Jesus inspirava o bálsamo de sua missão. Delas obtinha a coragem e a força para denunciar o mal que corroia até mesmo a religião. Eram diálogos de amor, por isso conversas com sentido, que davam sentido, tanto para os passos pelas estradas da Galiléia, quanto para o trabalho na carpintaria.

         Os discípulos terão muitas vezes a experiência de Maria: acordar no meio da noite e não encontrar Jesus. Será isso questão marteladora, ao mesmo tempo, encanto. Depois da cruz: necessidade, força e festa.

         Das conversas com o Pai, Jesus enquanto mestre aprendeu a ensinar, enquanto servo a servir, enquanto profeta a denunciar e anunciar, enquanto sacerdote a se oferecer, enquanto amigo a amar. Das conversas com o Pai, Jesus bebeu da fonte que jorra para a vida eterna, e por isso teve a coragem de afirmar sobre si, tal verdade: “também Eu Sou”. Talvez a cruz só foi entendida na última dessas conversas, na noite de quinta-feira – noite da refeição, noite do último gesto.

         Quando me recordo disso tudo, reafirmo a convicção de que não posso deixar de ter também minha conversa com o Pai, falar com Aquele que é o Princípio e o Fim e no meio do caminho a Mão que nos sustenta. Se eu quero ser parecido com Jesus, ou mais, deixar que Ele viva em mim e assim o mundo conheça-o e viva como Ele viveu, preciso começar a acompanhar seus gestos, principalmente essas conversas sinceras e francas com Deus. Falar com quem se ama é ter a liberdade da franqueza e da honestidade. Aprendi com Ele.

         Ir ao Pai, como Jesus ia, é ser amado de um modo muito particular, é também ser desafiado, jamais julgado ou condenado. Deus que conhece nossas dificuldades e ainda mais as nossas qualidades, faz nos reconhecer sua voz em todos os acontecimentos do dia, se lhe conhecemos na simplicidade e intimidade da oração, se fizemos a experiência de Nele nos perder, para Nele nos encontrarmos.

         Conversar com o Pai é harmonizar as batidas de nosso coração com o Dele, para num ritmo comum, fazer com que a dança da vida envolva-nos completamente de tal forma que seu gingado conquiste outros irmãos para celebrar a dança da integração.

         Das conversas com o Pai Cristo falou às multidões e pediu que rezássemos imitando a Ele. Nessas conversas, compreendeu sua missão enquanto Filho, encarnou na história da Humanidade, sendo trabalhador, filho de Maria, filho de José, irmão dos pobres e plenitude de todo homem. Das conversas com o Pai também eu posso compreender o mistério no qual sou conduzido, sabendo que o amor e a justiça são leis que me guiam à verdade, à vontade de Deus que fala e escuta os filhos com amor de Pai.

         E quando não sei começar ou terminar essas conversas tão necessárias e tão gostosas, com coração humilde, faço exatamente como o Filho amado ensinou. Digo: “Pai nosso que estás nos céus, santificado seja o vosso nome, venha a nós o vosso reino, seja feita a vossa vontade, assim na terra como no céu. O pão nosso de cada dia nos daí hoje, perdoai as nossas ofensas assim como nós perdoamos a quem nos tem ofendido e não nos deixeis cair em tentação, mas livrai-nos do mal. Amém!”

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