O Cristianimo e a ética ambiental
A ética no
cristianismo é um vasto campo que diz respeito a muitos assuntos. O
cristianismo principalmente no ocidente contribui para a solidificação de
códigos de ética, para a ética presente nas diferentes culturas, pela força que
sempre possuiu, fundamentando-se sempre na vida de Cristo narrada nos
Evangelhos e nos escritos da Bíblia, que possui muito da tradição judaica. O
tema da ética ambiental não aparece explicitamente entre os cristãos até tempos
recentes. Entretanto sempre houveram figuras de grande importância que
trouxeram e apresentaram uma espécie de “relação com a criação” e nesta
relação, como em todas as outras, perpassa a ética.
O
cristianismo por não ter apresentado esse tema explicitamente no sentido do
“cuidado com a casa comum de todos” tem sido muito criticado. Destarte uma
coisa é necessária ser entendida: m uito do debate sobre a ética na tradição
cristã (que em grande parte bebe da tradição judaica) gira em torno de uma
única palavra em Gênesis 1, 28 (“E Deus os
abençoou, e Deus lhes disse: Frutificai e multiplicai-vos, e enchei a terra, e
sujeitai-a; e dominai sobre os
peixes do mar e sobre as aves dos céus, e sobre todo o animal que se move sobre
a terra.”) onde é ordenado ao homem a prática de
"domínio" sobre a Terra, e isto tem sido interpretado de uma forma a
condenar o cristianismo. Embora estas
passagens reforçam a afirmação da tradição judaico-cristã como antropocêntrica,
elas também fornecem a base para afirmar que os seres humanos têm deveres
morais para com o meio ambiente. Algumas pessoas religiosas e
não religiosas alegam que esta palavra significa e quer dizer que os seres
humanos devem exercer domínio total e desmedido sobre as criaturas da terra.
Mas não levam em consideração que o mesmo termo hebraico é usado para descrever
os cuidados de Deus da Terra e seus povos, fundada no amor e compaixão. Entre os estudiosos
da Bíblia, uma interpretação consensual surgiu: os seres humanos devem ter o
mesmo cuidado que o Criador tem para conosco próprios na criação. Assim, o
"domínio" deve ser traduzido como "dever de cuidar”. Ainda, em Gênesis 2 é
apresentada uma história da criação alternativa, no qual o homem é criado a
partir do pó e colocado no "jardim" para "cultivar e proteger
(ou serviço)." Assim, esta
história da criação, descreve os deveres do homem em direção à terra.
Portanto, o
grande poder sobre o resto da criação concedido ao homem no ato criacional Jesus não abordou expressamente a ética ambiental, isso
não era uma questão latente na época, como outros problemas de seu tempo.
Teólogos chamados “da Criação”, como Sean MacDonagh, dizem que foi através de
suas ações e parábolas que Jesus mostrou a seus seguidores que tinha
preocupação com o meio ambiente. Isto foi mostrado de duas maneiras
diferentes. Primeiro: ambientes naturais. Alguns
momentos-chave do ministério de Jesus estão na natureza (sermão da Montanha, no
Lago (tempestade), batizado no rio (ambiente natural), além disso, quando Jesus
estava se preparando para sua traição, ele se colocou no Jardim do Getsêmani,
(rodeado de coisas naturais para estar a sós com Deus). Segundo: parábolas
ligadas à natureza. O Semeador
e as sementes (Mc 4, 3-9,
13,3-9 Mt, Lc 8,5-8); O grão de
trigo (João 12,24); As ervas
daninhas no grão ou do Joio
(Mt 13,24-30); A Figueira
Floração (Mt 24,32 ss;
13,28; Lc 21,19-31); As aves do
céu (Mt 6,26; Lc 12,24); As flores
do campo (Mt 6,28-30; Lc
12,27 s.); Os Sinais
do Tempo (Lc 12,54-56; Mt
26,2; Mc 8,11-13). é
para ser jardineiro, para cuidar da criação de Deus para que continue a
produzir "árvores que sejam agradáveis à vista e boas para comida"
(Gn 2, 9). Este papel é uma característica exclusiva da moral
bíblica, em especial o conceito de "liderança servidora" ressaltada
no Novo Testamento: “Jesus chamou-os e disse: ‘Vocês sabem que os
governantes dos gentios dominam sobre eles, e os seus grandes exercem
autoridade sobre eles. Não deve ser assim com vocês. Do contrário, quem quiser
tornar-se grande entre vós, seja vosso servo, e quem quiser ser o primeiro
deverá ser escravo - assim como o Filho do Homem não veio para ser servido, mas
para servir e dar a sua vida em resgate por muitos” (Mt 20, 25-28).
Cristãos que tiveram destaque na relação com
o meio ambiente
Embora a
história cristã como um todo não tem sido explicitamente favorável para a
importância da ética ambiental, houve pessoas
significativas que fizeram contribuições importantes para a
conscientização ambiental. São Francisco de Assis é exemplo de alguém que
entendeu a graça de viver em um mundo carregado de vida divina, em um mundo
sacramental. Foi nomeado padroeiro dos ecologistas,
pois ele celebrou a beleza e a diversidade da criação através de sua oração e
pregação. O seu "Cântico das Criaturas"
canta toda a criação como sendo irmão e irmã. Esta música é uma expressão de sua imaginação moral, porque
reflete como ele entendia o que era viver uma vida de parentesco essencial com
toda a criação. Ele pregou a água, pedras,
flores, pássaros e outros animais. Via o
mundo criado como membros da família divina. João Paulo II referiu-se a ele
dizendo que o santo oferecia aos cristãos “o exemplo do autêntico respeito pela
integridade da criação. Amigo dos pobres, amado pelas criaturas de Deus, ele
convidou a todos – animais, plantas, forças da natureza, inclusive o irmão sol
e a irmã lua – a honrar e louvar o Senhor. Do Pobrezinho de Assis vem o
testemunho que, estando em paz com Deus, podemos melhor dedicar-nos a construir
a paz com toda a criação, que é inseparável da paz entre os povos”. Sua
intimidade com a criação surgiu a partir de experiências que teve na estendida
península italiana. Sendo um dos
homens que mais marcou o cristianismo e a história, a ponto de se considerado
como o homem do milênio, destaca-se no cristianismo ocidental como alguém que
viveu uma bio-cêntrica visão da vida moral.
Há outros exemplos ainda: Agostinho,
por exemplo, não exclui de sua vasta produção bibliográfica, este tema. Em seu
comentário sobre o Gênesis não destaca
a concessão de domínio do homem sobre a natureza, embora conclua dizendo que o
homem tem uma posição única, que está sendo criado "à imagem de
Deus", referindo-se à racionalidade. Ele vê a natureza como fundamentalmente
boa, inclusive coisas que não servem ao homem, como “cardos”. No entanto, ele argumenta que os animais são do homem para serem
usados, uma vez que Jesus
usou suínos inocentes para eliminar os maus. A posição de
Aquino é mais claramente antropocêntrica. Em sua "Summa
Contra gentios" argumenta
que o direito do homem é Deus, mas os animais não têm esse direito, portanto o
seu papel só pode ser para servir ao homem em seu telos. Assim, não
há moral imperiosa
para o tratamento de animais, exceto se a crueldade aos animais encoraja
crueldade para com os homens. Kant
viria a adotar a mesma posição, e Descartes diria que
os animais sequer sentem dor.
Lutero reanalisou os argumentos bíblicos,
observando que o "domínio" foi concedido a Adão e Eva antes da queda, e que o homem caído
não pode representar um confiável mordomo do mundo natural. No entanto, ele
afirma que a natureza também é
caída. Essa atitude, ao
contrário de Agostinho, dá razão ao homem para alterar a natureza como um ato
redentor. Na verdade, a visão de
Agostinho de que a criação é o estudo adequado d a humanidade é mais frequentemente usado como
justificativa para a ciência do que Lutero.
Santa
Hildegarda de Bingen foi líder de uma comunidade monástica no século XII. qualidades de cura da natureza e ensinou a necessidade de respeitar a natureza e aprender com ela.
Seus escritos, música e arte refletem um profundo senso
de unidade com a criação e um imenso respeito pelo trabalho do criador. São
Francisco de Sales apresenta a natureza, os astros e todo planeta, dentro do
seu ciclo de estações, morte e nascimento, como mestra do ser humano na
compreensão do grande amor de Deus. Era um contemplativo da natureza. A
criação, para ele, mostrava sinais do amor de Deus, por isso tinha que ser
respeitada. Seus escritos mostram ser ele um estudioso dos hábitos das aves,
das abelhas, do ciclo das flores e das águas, além das estações e dos astros do
céu. Ela era uma estudante
famosa da natureza que investigou e fez uso das
O chamado “Patriarca Verde",
Bartolomeu I é conhecido por declarar que "o crime contra o mundo natural
é um pecado", em 1995. Ele
organizou várias viagens em um navio de convocar os líderes religiosos,
científicos e políticos para a criação de iniciativas de proteção ambiental. Enquanto alguns podem achar a linguagem do "pecado"
preocupante, o Patriarca Bartolomeu captou o interesse da mídia grande. As
chamadas "principais" denominações protestantes tem publicado
inúmeras declarações e resoluções no que concerne a este assunto.
Mais recentemente, influentes denominações evangélicas começaram a articular
sua compreensão da ética ambiental, que algumas descrevem como "cuidado
com a criação”.
O anterior
Papa, João Paulo II, fez uma contribuição significativa para a recuperação da
ética do cuidado dentro do cristianismo. Nomeou São Francisco de Assis o santo
Padroeiro da Ecologia, em 1979. Em 1990, escreveu no Dia Mundial da Paz a
mensagem intitulada "A Crise Ecológica: uma responsabilidade comum",
e isto, combinado com os esforços em ortodoxos e algumas denominações
protestantes trouxeram a maioria dos ramos do cristianismo para o diálogo com
os problemas ambientais. Em "A Crise Ecológica", ele afirmou que os
problemas ambientais são uma crise moral para toda a humanidade, e que o
ambiente é eticamente significativo em seu próprio direito. Em outras palavras,
a natureza tem valor intrínseco como a criação de Deus. "Sua conclusão
diz: "Hoje, a crise ecológica assumiu proporções tais como a
responsabilidade de todos. Como já salientado, os seus diversos aspectos
demonstram a necessidade de concentrar esforços destinados a estabelecer os
direitos e obrigações que pertencem a indivíduos, povos, Estados e da
comunidade internacional. Assim, todos os membros e grupos da família humana,
independente de sua fé ou se eles têm fé, têm responsabilidades para com o meio
ambiente.”
A Campanha
da Fraternidade 2011, realizada no Brasil pela CNBB trouxe como tema:
Fraternidade e a Vida no Planeta, e o lema: "A criação geme em dores de
parto" (Rm 8, 22). Teve como objetivo geral, contribuir para o
aprofundamento do debate e busca de caminhos de superação dos problemas
ambientais provocados pelo aquecimento global e seus impactos sobre as
condições da vida no planeta. Foi uma maneira de promover a discussão e
conscientização entre os cristãos sobre a realidade do planeta. Ofereceu
reflexões, dados e provocou nos fiéis a dimensão da fé em relação à natureza o
planeta como um todo, denunciando
situações e apontando responsabilidades no que diz respeito aos problemas
ambientais decorrentes do aquecimento global. Propôs atitudes, comportamentos e
práticas fundamentados em valores que tenham a vida como referência no
relacionamento com o meio ambiente. Quis mobilizar pessoas, comunidades,
Igrejas, religiões e sociedade para assumirem o protagonismo na construção de
alternativas para a superação dos problemas socioambientais decorrentes do
aquecimento global. Porém, não se pode esquecer que esta não foi a primeira vez
que a Campanha da Fraternidade falou em ecologia. O tema já foi tratado, de
modo especial, em 1979 quando o tema foi “Por um mundo mais humano”, e o lema: “Preserve
o que é de todos”. Depois em 1984 com o tema da “Deus, fonte de vida”e o lema,
“Para que todos tenham vida”. Em 2004 trouxe o tema “Fraternidade e água” e o lema,
“Água, fonte de vida”. Foi talvez
uma das Campanhas da Fraternidade que teve maior impacto na população,
sobretudo católica. Por fim em 2007 o tema proposto foi “Fraternidade e
Amazônia” e o lema, “Vida e missão neste chão”, onde abordou a natureza
destruída na Amazônia. Também, vale
ressaltar que as Conferências realizadas na América Latina, a saber: Medellín,
Puebla, Santo Domingo e Aparecida, sempre abordaram este tema com ênfase.
A mística como caminho de harmonia entre seres humanos e natureza
O
cristianismo anuncia o Reino de Deus como uma harmonia entre a natureza, os
animais e ao homem. Quem sonhara isto fora o profeta Isaías no Antigo
Testamento, e os cristãos celebram essa perspectiva, sem separação, dominação,
guerra, desarmonia entre homem e criação como um todo: “o lobo é hóspede do cordeiro,
a pantera deita ao pé do cabrito, touro e o leão comem juntos; a vaca e o urso
se confraternizam e o leão come palha com o boi; a criança de peito brinca à
toca da serpente e o menino crescidinho mete a mão no buraco do escorpião (Is
11, 6-8). Podemos dizer que o resgate da relação com o espiritual, na
atualidade está relativizado e por isso todos os seus aspectos também - "A
arrogância do homem que vive como se Deus não existisse, leva a explorar e
deturpar a natureza, não a reconhecendo como uma obra da Palavra criadora
(Bento XVI, Verbum Domini, 108). Uma profunda relação com a tradição cristã
para os cristãos fará destes muito mais zelosos pela obra de Deus, a criação.
Se outrora os problemas climáticos não eram tão latentes, se a escassez de recursos
se dava por culpa de mesquinhos acumuladores e exploradores de bens, hoje o
planeta inteiro está em risco e a fome e miséria é uma ameaça de principio
entre todas as que podem vir – a mesquinhez alcançou dimensão inimaginável a
nossos antepassados.
Teóricos e
religiosos afirmam que dentro de assuntos religiosos só a mística salvará a
religião e o mundo. A fé, tão pensada nos últimos tempos, necessita agora,
estabelecer uma relação pessoal e comunitária com o próprio principio de onde
surge. Na ótica cristã podemos dizer: ou o cristão abraça Cristo e sua proposta
de uma forma mística ou não saberá ser cristão, nem irradiar a proposta cristã
e se perderá no meio do caminho. O resto o mundo oferece, mas a relação com
Deus, só a fé. Cristãmente, a natureza precisa ser contemplada, senão será
vista apenas como instrumento. O outro tem que ser visto como irmão, ou será
visto como um rival, que pode me superar a qualquer momento. A partilha,
aspecto central do cristianismo, uma vez que é fruto da caridade, mostra que é
a solução para o equilíbrio na distribuição do que se produz na terra, bem como
de seu cultivo. Virtudes cristãs como a Prudência, Justiça, Temperança faz-se
mais necessárias do que nunca. Pecados como o da gula, luxúria, avareza, ira,
soberba, vaidade, preguiça não perdem nunca sua dimensão original, mas cada vez
mais se abrem a dimensões do cotidiano humano e com certeza à dimensão
ecológica. Pecar é ferir a Deus, a si, ao próximo e à criação. Mesmo que se
denomine diferente esses ferimentos que fazem a terra agonizar, necessário é
reagir contra. O cristianismo oferece todo o necessário para isto aos cristãos,
se estes souberem ser um com a criação e o criador que demonstrou seu amor no
Filho Redentor e constantemente clama pela ação do Espírito a dimensão
salvífica da terra que “geme em dores de parto”.
Em tempos de
crise ecológica e ética, o cristianismo pode ajudar e muito. Suas bases
garantem que o proceder do ser humano pode e deve ser ético em relação à
natureza. O amor, como proposta principal de Cristo, se alarga muito mais. O
martírio, sempre visto como supremo ato de fidelidade à Cristo, hoje tem como
provocação as questões ambientais. Ir Dorothy e bispos no Brasil, por exemplo,
são exemplos deste testemunho. O cristão podem oferecer sua ética de respeito e
co-irmandade ao mundo, como sinal da relação homem-planeta e por este ideal dá
a própria vida. A salvação da humanidade se faz ver pela salvação do
ecossistema, das tradições que respeitem o equilíbrio da natureza, das ações
que correspondam ao movimento natural da vida. “Eu vim para que todos tenham
vida e a tenham em abundância” (Jo 10, 10) eis o clamor do cristianismo ético e
responsável, que todos tenham vida, que o planeta viva, que a vida possa
continuar existindo em nossa “casa” até quando “Deus quiser”, como diz nosso
povo.
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